Claudia Maria Duarte de Sá Guimarães
Keywords: LASERS; LASERS DE ESTADO SÓLIDO; ONICOMICOSE; FOTOTERAPIA; ANÁLISE ESPECTRAL; TRICHOPHYTON.
A onicomicose é patologia responsável por mais de 50% das doenças que afetam as unhas.1 Seu tratamento permanece um desafio embora tenham ocorrido avanços com a introdução das drogas antifúngicas na década de 1990.2
A onicomicose no hálux é patologia de tratamento difícil e sujeita a recidivas. Os fungos dermatófitos, os fungos não dermatófitos e a Candida spp3 constituem sua causa primária.
Alguns fatores do hospedeiro influenciam o tratamento - idade, sexo, doenças vasculares, diabetes, hipertensão arterial, número de unhas dos pés infectadas, duração da infecção, história de tratamento prévio, tipo de onicomicose, percentual de envolvimento ungueal, espessura da unha, presença de dermatofitoma, envolvimento da matriz, envolvimento lateral e ritmo de crescimento da unha.3 Outros fatores citados são a higiene inadequada, os traumas frequentes nas unhas, os pés dos atletas, a pele prolongadamente hidratada, sudorese excessiva nos pés, prática de andar descalço, uso de calçados abertos, rotina de nadadores, compartilhamento de instalações balneares, e o clima quente.4 A avaliação desses fatores auxilia a orientação do tratamento e a necessidade de combinações terapêuticas. Registra-se o aumento de determinados microrganismos como a Candida (albicans e parapsilosis) e Fusarium spp, sobretudo em indivíduos imunocomprometidos.
O laser Nd-YAG 1064nm situa-se na faixa de espectroscopia vibracional do infravermelho próximo (NIR-near infrared) que corresponde ao comprimento de onda de 750 a 2500nm. Segundo as características físicas dessa faixa pelos métodos analíticos, ela é rápida (um minuto ou menos), não destrutiva, não invasiva, com alta penetração do feixe de radiação, adequada para uso em linha e de uso universal.5,6 O uso de equipamentos com emissão de comprimentos de onda NIR tem demonstrado fotoinativação de fungos e outros patógenos microbianos sem danificar os tecidos saudáveis adjacentes. A ação postulada nos microrganismos é a interação do plasma e membranas mitocondriais, e a geração de radicais de oxigênio e destruição do Staphylococcus aureus, Escherichia coli, Candida albicans e Trichophyton rubrum, entre outros.7,8
Estudo clínico monocêntrico, retrospectivo, não comparativo realizado em consultório privado no Rio de Janeiro, aberto para avaliar a eficácia do laser Nd-YAG 1064nm submilissegundos (0,3ms) no tratamento da onicomicose crônica. O estudo se desenvolveu de acordo com os princípios éticos da declaração de Helsinki de 1975, atualizada em 2000 e com redação revisada em Edimburgo,2008.
Nele foram incluídos 30 pacientes dos 97 casos acompanhados, com idades entre 25 e 80 anos, com onicomicose do hálux direito e/ou esquerdo de intensidade leve, moderada ou grave, que apresentavam a patologia há mais de três anos, que já haviam sido submetidos ao tratamento sistêmico e/ou tópico por mais de um ano, sem melhora do quadro clínico. Assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, após receber informações sobre a doença e os cuidados preventivos. Foram excluídos aqueles pacientes com cultura negativa, uso de medicamento sistêmico há menos de um ano e os que não completaram o ciclo de tratamento. Recomendou-se a utilização de pó antifúngico nos calçados (ácido undecilênico 2mg, undecilenato de zinco 150mg, propionato de cálcio 60mg, hexylresorcinol 0,5mg), a lavagem das meias com água quente, evitar a remoção das cutículas e o uso de tesoura no corte das unhas (substituída pela lixa descartável).
As fotografias padronizadas para o controle clínico foram realizadas com câmera Canon T1i, lente 60mm fixa, fundo branco e flash.
Após a coleta de material para cultura, foi aplicado o laser Nd-YAG de 1064nm Joule (Sciton) com ponteira Clearsense, três passadas até atingir a temperatura mensurada em tempo real entre 42ºC e 44ºC, com movimentos espirais da borda externa em direção ao centro da unha. Foram utilizados de 5 a 7j/cm2, 0,3ms de duração de pulso, 4,0Hz em três sessões iniciais com intervalo semanal, seguidas de sessões complementares até o crescimento total da unha doente.
Os pacientes com menos de 50% de comprometimento da unha foram acompanhados de três em três meses, e aqueles com mais de 50%, mensalmente.
O tratamento foi bem tolerado pelos pacientes, que apontaram apenas desconforto transitório durante a aplicação do laser. Não foram observados efeitos adversos. O tempo de tratamento e o número de sessões necessárias sofreram influência da intensidade do comprometimento da lâmina ungueal (Tabela 1). Dos 30 pacientes selecionados, observou-se que 18 tinham mais de 50 anos e 12 menos de 50 anos (seis tinham menos de 35 anos). O comprometimento da lâmina ungueal foi superior a 50% em 23 casos e inferior a 50% em sete casos. Os agentes patogênicos encontrados foram Trichophyton mentagrophytes (quatro casos), Trichophyton rubrum (cinco casos), Trichosporon spp (oito casos), Candida spp (sete casos), Fusarium spp (cinco casos), Scytalidium dimidiatum (um caso), e infecções mistas (quatro casos de associação de fungos e/ou bactérias). O número de sessões variou de três a 16 para cada caso. Observou-se melhora clinica variável nas unhas tratadas. (Figuras de 1 a 5)
A luz tem sido utilizada desde a Antiguidade no tratamento de doenças. As primeiras experiências com a fototerapia datam de 100 anos atrás quando Raabe e Von Tappeiner estudaram a ação da acridina vermelha sobre a cultura de paramecios. Desde então, vários tipos de corantes (entre eles o azul de toluidina, o azul de metileno, eosina, 5-ALA etc.) foram testados para eliminar microrganismos através da terapia fotodinâmica. Contudo a toxicidade de alguns corantes utilizados é elevada, e a absorção pelo alvo exige a eliminação da lâmina ungueal, dificultando sua utilização clínica. Atualmente, com o gradual aumento da resistência dos microrganismos aos medicamentos, outros métodos de tratamento estão em pesquisa, como os testes com corantes menos tóxicos e o uso dos lasers na faixa do NIR (870/930nm, 1064nm, 1444nm), com o objetivo de destruir bactérias e fungos patogênicos com um mínimo de dano ao hospedeiro.
A onicomicose é patologia de difícil tratamento que sofre a influência de fatores do hospedeiro e do agente patogênico. A penetração dos medicamentos tópicos no leito ungueal infectado pode ser acentuada com a abrasão da unha9 ou com o emprego de estratégias para melhorar a permeação da droga com o uso de sulfitos, peróxido de hidrogênio, ureia, ácido salicílico, entre outros.10 Entre as substâncias citadas o peróxido de hidrogênio e a ureia são aliados no combate aos dermatofitomas e a unhas muito espessas, assim como a abrasão da unha afetada. O baixo crescimento da unha devido ao uso de calçados apertados ou dificuldades circulatórias pode ser combatido com orientação sobre uso de calçados adequados, higiene e o estímulo do laser Nd-YAG 1064nm.
O laser Nd-YAG 1064nm aplicado com baixas energias e pulsos curtos promove a angiogênese, estimula a produção de fibras colágenas11,12 e promove a alteração da parede dos microrganismos. Melhora a microcirculação das extremidades, acelera o crescimento das unhas e inibe a multiplicação dos microrganismos sem o inconveniente efeito mutagênico do ultravioleta e a vantagem de não precisar de fotossensibilizante, como no caso da terapia fotodinâmica, que associa a luz de led (light emitting diodes) na faixa NIR.13-14
Carney e colaboradores, partindo da hipótese de que o efeito do laser Nd:YAG poderia ser decorrente do efeito térmico ou ação direta na viabilidade dos fungos, realizaram estudo no qual avaliaram in vitro e in vivo três diferentes patógenos - Trichophyton rubrum, Epidermophyton floccosum e Scytalidium dimidiatum. Esses autores observaram melhora clínica dos dez pacientes estudados durante 24 semanas, mas não conseguiram confirmar se a ação da hipertermia seria suficiente para explicar a redução da intensidade da onicomicose nas unhas tratadas. Utilizaram 16j/cm2, duração de pulso de 0,3 milissegundos, spot size de 5mm e taxa de repetição de 2,0Hz (500 disparos por sessão nas dez unhas) em todas as sessões, e consideraram que o tratamento foi acompanhado com dor e queimação. 15-21 Na minha experiência, considero a utilização de cinco a 7j/cm2, duração de pulso de 0,3 milissegundos, spot size de 6mm e taxa de repetição de 4,0Hz bem tolerável, em várias passadas. Utilizando-se a mensuração do termômetro da ponteira como ponto final para a sessão, com energia suficiente acumulada para atingir entre 42ºC e 44ºC (sinalizada pela luz amarela) alcança-se maior número de disparos, entre 1.200 e 1.600 disparos, nas dez unhas tratadas. O controle da temperatura em tempo real é importante para evitar onicólise por coagulação das proteínas, que ocorre próximo aos 50ºC.
O tratamento da onicomicose com o laser Nd:YAG 1064nm mostrou-se bem tolerável. Os casos tratados mostraram aceleramento do crescimento das unhas e melhora de seu aspecto clínico. Levando-se em consideração que foram selecionados apenas casos crônicos já tratados com outras modalidades terapêuticas, pode-se dizer que a utilização desse laser é opção válida nos casos de falha terapêutica ou naqueles em que a medicação sistêmica é contraindicada.
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Trabalho realizado no consultório particular da autora - Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
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