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Diagnóstico por imagem

Tomografia de coerência óptica no diagnóstico do carcinoma basocelular

Elimar Elias Gomes1; Tatiana Cristina Moraes Pinto Blumetti1; Mariana Petaccia de Macedo2; Marcela Pecora Cohen3; Maria Dirlei Bergami2; Gisele Gargantini Rezze1

Data de recebimento: 01/08/2013
Data de aprovação: 06/09/2013
Suporte Financeiro: Projeto FAPESP Número 2011/19991-1
Conflito de Interesses: Nenhum
Trabalho realizado no AC Camargo Câncer Center - São Paulo (SP), Brasil.

Abstract

O diagnóstico precoce do carcinoma basocelular, neoplasia cutânea de alta incidência, pode trazer grandes benefícios ao paciente. Muitas vezes lesões pouco pigmentadas, lesões iniciais pequenas e lesões superficiais podem representar um desafio diagnóstico clínico e dermatoscópico por não apresentar os achados típicos dessa neoplasia. Nessa situação, a tomografia de coerência óptica, tecnologia promissora na dermatologia, é recurso auxiliar não invasivo que pode ser incorporado à prática clínica.


Keywords: CARCINOMA BASOCELULAR, DIAGNÓSTICO POR IMAGEM, TOMOGRAFIA DE COERÊNCIA ÓPTICA.


INTRODUÇÃO

O carcinoma basocelular (CBC) é a neoplasia maligna mais comum na população branca. Sua morbidade resulta de invasão e destruição de tecidos locais e raramente origina metástases. Dados epidemiológicos mostram incidência crescente, atingindo até pessoas jovens.1 A importância do diagnóstico precoce tem valor no direcionamento da melhor opção terapêutica, promovendo menor morbidade operatória, redução de custos, menores taxas de recidiva e melhor prognóstico para o paciente. Muitas vezes de fácil identificação ao exame clínico, o CBC tem seu diagnóstico dificultado principalmente em lesões iniciais pequenas e superficiais.

Nas últimas duas décadas houve progressiva expansão de técnicas não invasivas que auxiliam no diagnóstico precoce das lesões cutâneas, tais como a dermatoscopia, a microscopia confocal in vivo e a tomografia de coerência óptica.2 A tomografia de coerência óptica (OCT - optical coherence tomography) é técnica de diagnóstico por imagem promissora, que fornece imagens da morfologia dos tecidos biológicos in vivo e em tempo real com microrresolução. Foi inicialmente descrita na dermatologia por Welzer e colaboradores (1997) e, desde então, vem apresentando avanços técnicos e de definição da imagem.3 Essa tecnologia é baseada no princípio físico da interferometria e tem funcionamento análogo ao do ultrassom, porém, os pulsos de ultrassom são substituídos por fonte de luz de baixa coerência com comprimento de onda de 1300nm (próxima ao infravermelho). Um sistema óptico permite a obtenção de imagens, em preto e branco, em duas ou três dimensões, perpendiculares em relação à superfície cutânea, semelhantes à histologia e sem causar danos ao paciente.3,4

 

RELATO DE CASO

Paciente do sexo feminino, 38 anos, fototipo 3, queixando-se de lesão eritematosa na região esternal à direita há seis meses. Ao exame apresentava placa eritemato-descamativa, brilhante, medindo cerca de 7mm de diâmetro. À dermatoscopia observam-se lesão de fundo rosado, sem pigmentação evidente, e a presença de vasos lineares curtos distribuídos por toda a lesão (Figura 1). Partindo-se do aspecto clínico e dermatoscópico, a hipótese diagnóstica principal foi de CBC superficial. Na ausência de critérios dermatoscópicos conclusivos para o diagnóstico de CBC, os diferenciais de queratose actínica, carcinoma espinocelular in situ e dermatose de caráter inflamatório não poderiam ser descartados. Na tentativa de elucidação do caso, optou-se pela realização da tomografia de coerência óptica, utilizando o aparelho OCT Vivosight© (Michelson Diagnostics, Orpington, Inglaterra). Nesse exame, diferentemente da estrutura normal da pele apresentada na figura 2, observamos completa desorganização da junção dermoepidérmica. (Figura 3) Em algumas áreas, é possível observar blocos hiporreflexos (mais escuros) em contiguidade com a epiderme projetando-se para a derme superficial. (Figura 4 e 5) Ainda é possível distinguir áreas hiporreflexivas modificando a estrutura da derme papilar que podem corresponder a infiltrado inflamatório e áreas lineares escuras na derme reticular que correspondem à proliferação vascular.(Figura 5) Diante desses achados, compatíveis com a descrição do CBC, já descritos na literatura, a paciente foi submetida a exérese da lesão com margens de segurança. O exame anatomopatológico confirmou o diagnóstico de CBC superficial com margens de ressecção livres de comprometimento neoplásico.

 

DISCUSSÃO

De baixo custo, fácil realização e amplamente disseminada, a dermatoscopia tornou-se parte indispensável na avaliação dermatológica, promovendo aumento significativo da sensibilidade do exame clínico para o diagnóstico precoce das diversas neoplasias cutâneas.2

Em 2000, Menzies e colaboradores elaboraram um modelo diagnóstico dermatoscópico para o CBC pigmentado que mostrou sensibilidade de 97% e especificidade de 93%.5 Esse modelo foi baseado na ausência de rede pigmentar e na presença de pelo menos uma das seguintes características dermatoscópicas: ulceração, ninhos ovoides azul-acinzentados grandes, múltiplos glóbulos azul-acinzentados, áreas em folha, áreas em raio de roda e telangiectasias arboriformes. Em 2010, Altamura e colaboradores estudaram retrospectivamente 609 casos de CBCs dos diversos subtipos histológicos, pigmentados ou não, e avaliaram a varialibilidade e relevância diagnóstica dos diversos achados dermatoscópicos.6 Nesse estudo, os achados descritos por Menzies foram considerados padrões dermatoscópicos clássicos do CBC, tendo sido incluídos outros achados dermatoscópicos, chamados de não clássicos.5,6 Os achados descritos como não clássicos foram telangiectasias superficiais bem curtas, erosões pequenas múltiplas, estruturas concêntricas e múltiplos pontos azul-acinzentados em foco.6 Nesse contexto, lesões de CBC pouco pigmentadas, iniciais, pequenas e superficiais podem representar um desafio diagnóstico clínico e dermatoscópico por não apresentar achados dermatoscópicos típicos do CBC.

A tomografia de coerência óptica é exame não invasivo, rápido e de fácil realização.As imagens obtidas são perpendiculares à pele, semelhantes ao corte histológico-padrão, o que facilita sua interpretação. Amplamente utilizada em outras áreas médicas como na oftalmologia, cardiologia e gastroenterologia, essa nova tecnologia tem seu uso recente na dermatologia, porém com resultados promissores no diagnóstico diferencial de tumores cutâneos não melanocíticos.3,4

Os primeiros estudos sobre o padrão das imagens do CBC na tomografia de coerência óptica são recentes e demons-tram perda da arquitetura normal das diversas camadas da pele e estruturas semelhantes a blocos de tumor hiporreflexos (mais escuros em relação ao tecido epidérmico) circundados por silhuetas escuras (áreas lineares próximas ao preto). Esses achados foram correlacionados à histologia, correspondendo aos blocos tumorais de células basaloides característicos dessa neoplasia. As silhuetas escuras correspondem à fenda ao redor dos blocos tumorais, e a presença de faixa branca circundando os lóbulos enegrecidos, ao estroma tumoral.4,7-9

Em estudo realizado por Mogensen e colaboradores, as principais características observadas nas imagens da tomografia do CBc foram a perda da estrutura lamelar da epiderme principalmente nos CBCs superficiais, alterações focais da epiderme com estrias brancas e pontos em algumas lesões, e estruturas lobulares acinzentadas ou enegrecidas circundadas por borda esbranquiçada.10

No caso apresentado, a tomografia de coerência óptica demonstrou achados compatíveis com os descritos na literatura para essa nova tecnologia. Isso indica a reprodutibilidade do exame, boa correlação histopatológica e, mais importante, trouxe benefício ao paciente desde que evitou a biópsia incisional, reduzindo os custos e agilizando o tratamento definitivo.

 

Referências

1. Christenson LJ, Borrowman TA, Vanchon CM, Tollefson MM, Otley CC, Weaver AL, et al. Incidence of basal cell and squamous cell carcinomas in population younger than 40 years. JAMA. 2005;294(6):681-90.

2. Di Giacomo THB, Santiago AVD, Braga JCT, Blumetti TCMP, Ferreira JASLB, Canosa JM, et al. Perspectivas no uso da microscopia confocal in vivo na prática do cirurgião dermatológico. Surg Cosmet Dermatol. 2011;3(4):338-44.

3. Welzel J, Lankenau E, Birngruber R, Engelhardt R. Optical coherence tomography of the human skin. J Am Acad Dermatol. 1997;37(6):958-63.

4. Schmitz L, Reinhold U, Bierhoff E, Dirschka T. Optical coherence tomography: its role in daily dermatological practice. J Dtsch Dermatol Ges. 2013;11(6):499-507.

5. Menzies SW, Westerhoff K, Rabinovitz H, Kopf AW, McCarthy WH, Katz B. Surface microscopy of pigmented basal cell carcinoma. Arch Dermatol. 2000;136(8):1012.

6. Altamura D, Menzies SW, Argenziano G, Zalaudek I, Soyer HP, Sera F, et al. Dermatoscopy of basal cell carcinoma: Morphologic variability of global and local features and accuracy of diagnosis. J Am Acad Dermatol. 2010;62(1):67-75.

7. Olmedo JM, Warschaw KE, Schmitt JM, Swanson DL. Optical coherence tomography for the characterization of basal cell carcinoma in vivo: a pilot study. J Am Acad Dermatol. 2006;55(3):408-12.

8. Cohen PR, Schulze KE, Nelson BR. Basal cell carcinoma with mixed histology: a possible pathogenesis for recurrent skin cancer. Dermatol Surg. 2006;32(4):542-51.

9. Gambichler T, Orlikov A, Vasa R, Moussa G, Hoffmann K, Stücker M, et al. In vivo optical coherence tomography of basal cell carcinoma. J Dermatol Sci. 2007;45(3):167-73.

10. Mogensen M, Joergensen TM, Nürnberg BM, Morsy HA, Thomsen JB, Thrane l, et al. Assessment of Optical Coherence Tomography Imaging in the Diagnosis of Non-Melanoma Skin Cancer and Benign Lesions Versus Normal Skin: Observer-Blinded Evaluation by Dermatologists and Pathologists. Dermatol Surg.2009;35(6):965-72.


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