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Relato de casos

Tratamento da foliculite decalvante com laser Nd:YAG

Márcia Raquel Horowitz1, Emmanuel Rodrigues de França1, Silvana Maria de Morais Cavalcanti1, Ângela Cristina Rapela Medeiros1, Marcela de Lima Vidal1, Manuela Oliveira Resende1

Recebido em: 06/12/2012
Aprovado em: 26/05/2013
Trabalho realizado no Ambulatório de
Dermatologia do Hospital Universitário
Oswaldo Cruz (Houp) da Universidade de
Pernambuco (UPE) – Recife (PE) - Brasil.
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Abstract

O tratamento da foliculite decalvante representa grande desafio, com inúmeras recidivas e manutenção da atividade da doença por longo período. A remoção de pelo com laser vem sendo utilizada no manejo de desordens foliculares cicatriciais. Este relato tem por objetivoilustrar o caso de paciente portador de foliculite decalvante em membro inferior que realizou cinco sessões terapêuticas com laser neodímio:YAG (Nd:YAG) e assim obteve remissão completa das lesões inflamatórias.

Keywords: FOLICULITE, TERAPIA A LASER, DERMATOLOGIA, ALOPECIA


INTRODUÇÃO

O tratamento da foliculite decalvante representa grande desafio, com inúmeras recidivas e manutenção da atividade da doença por longo período. Muitas opções terapêuticas têm sido recomendadas: antibióticos sistêmicos e tópicos, corticosteroides tópicos, sistêmicos e intralesionais, isotretinoína e dapsona,1 não havendo, porém, consenso para o tratamento dessa dermatose. Outras alternativas terapêuticas têm sido descritas: inibidores tópicos da calcineurina,2 medicamentos biológicos3 e epilação a laser.4

A remoção de pelos utilizando laser é prática bastante corriqueira na dermatologia e algumas patologias foliculares inflamatórias e cicatriciais têm demonstrado resposta satisfatória a essa terapia.4-7

Este relato tem por objetivo ilustrar o caso de paciente portador de foliculite decalvante que realizou tratamento com laser neodímio:YAG (Nd:YAG) e obteve remissão completa das lesões inflamatórias.

RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, de 18 anos, com surgimento de lesões foliculares em membro inferior direito há aproximadamente cinco anos. Ao exame apresentava pústulas e pápulas foliculares com descamação periférica (Figura 1), quadro clínico compatível com foliculite decalvante.

Realizou tratamento com laser Nd:YAG em área teste com os seguintes parâmetros: fluência de 40J/cm2, duração do pulso de 30mseg e spot de 10mm. O paciente evoluiu sem intercorrências, e foram realizadas sessões subsequentes com modificação da fluência para 45J/cm2, perfazendo o total de cinco sessões para epilar a área acometida. Após o tratamento houve regressão completa das lesões e ausência de sinais inflamatórios sugestivos de foliculite (Figura 2), quadro que se manteve sem tratamentos adjuvantes por pelo menos dez meses.

DISCUSSÃO

A foliculite decalvante representa aproximadamente 11% dos casos de alopecia primária cicatricial.8 Predomina em adolescentes e adultos jovens, principalmente em pacientes negros do sexo masculino.8 Clinicamente se manifesta como pápulas foliculares eritematosas que evoluem para pústulas resultando em área de alopecia cicatricial centrífuga. Aparência em "tufos" usualmente é observada, em que vários pelos emergem de um único óstio folicular dilatado.

A etiologia dessa alopecia neutrofílica primária cicatricial não é totalmente compreendida.1 O Staphylococcus aureus parece ter papel importante na patogênese da foliculite decalvante e pode ser isolado em quase todos os pacientes sem tratamento.9 Tem sido sugerido que superantígenos ou citocinas que se ligam ao complexo maior de histocompatibilidade tipo II desempenham algum papel na patogênese.9,10 A possibilidade de predisposição genética também foi aventada.10

O tratamento da foliculite decalvante é um desafio, com presença de atividade da doença mesmo após várias tentativas terapêuticas. Desde que o S. aureus foi aventado como tendo papel importante na patogênese da foliculite decalvante, as opções de tratamento visam erradicar esse agente. Inúmeros antibióticos orais e suas combinações se mostraram efetivos no tratamento, porém a rifampicina na dose de 300mg duas vezes ao dia durante período de dez a 12 semanas foi relatado como sendo o melhor agente antiestafilocócico com período de remissão mais duradouro.9,10 Para impedir resistência bacteriana, recomenda-se associar clindamicina na dose de 300mg duas vezes ao dia.9 Antibioticoterapia tópica, como mupirocina, clindamicina, ácido fusídico ou eritromicina, pode ser associada ao antibiótico oral ou, em casos leves, ser realizada como monoterapia. 1 O uso de xampu com antissépticos como o triclosan também contribui para o tratamento.1

O uso de corticoide tópico ou intralesional pode ser útil para reduzir a inflamação e sintomas como prurido, queimação e dor. A prednisona oral só deve ser considerada em casos de rápida progressão e por curto período de tratamento.1

A dapsona também pode ser considerada como opção terapêutica pela atividade antibacteriana e anti-inflamatória direcionada aos neutrófilos, em associação com antibióticos ou em monoterapia.1

A remoção de pelo com laser tem sido utilizada no manejo de desordens foliculares cicatriciais. Um longo período de remissão foi alcançado com o uso de um laser de diodo de 810nm em paciente afro-americano com celulite dissecante do couro cabeludo.5 O laser de ruby de pulso longo também se mostrou eficaz no tratamento da celulite dissecante do couro cabeludo, da queratose pilar espinulosa decalvante do couro cabeludo e da pseudofoliculite da barba.6

O laser Nd:YAG 1064nm foi utilizado para redução de pelo e da formação de pápula na pseudofoliculite da barba em peles fototipo IV, V, e VI, segundo Fitzpatrick.7

O alvo da epilação a laser é a melanina do bulbo capilar, que se encontra na derme. A melanina absorve a luz emitida pelo laser. A energia é então convertida em calor, levando à destruição do bulbo.

Em pacientes negros, como no caso relatado, há um desafio na realização da epilação a laser já que a melanina epidérmica compete como cromóforo absorvendo a luz e consequentemente provocando aquecimento da epiderme, o que pode levar à formação de bolhas, alterações de pigmentação e cicatrizes, além de diminuir a eficácia do procedimento.

A absorção da luz pela melanina é três vezes maior na faixa de 800nm do que na de 1064nm. Independentemente do comprimento de onda, o aquecimento preferencial do pelo pode ser alcançado em indivíduos de pigmentação mais escura porque geralmente a epiderme é mais clara do que o pelo. No entanto, devido à dispersão da luz em comprimentos de onda mais curtos, um maior comprimento de onda de 1064nm penetra mais profundamente e, portanto, oferece maior janela de segurança em pacientes melanodérmicos.4 O dano epidérmico também pode ser reduzido com a utilização de pulsos de maior duração e sistemas de resfriamento.

Com base nas propriedades ópticas da luz na pele, a melhor combinação de remoção de pelo e preservação da epiderme é alcançada com laser de pulso longo. Assim, o laser Nd:YAG é boa opção para tratar patologias foliculares em indivíduos de pele escura,4 como o paciente do caso relatado, o qual obteve excelente resposta ao tratamento com ausência de efeitos colaterais.

CONCLUSÃO

Definitivamente, o tratamento da foliculite decalvante representa um grande desafio, com recidivas frequentes das lesões. A epilação a laser parece ser boa opção terapêutica para essa patologia, como se demonstrou no caso relatado. A escolha do laser é de extrema importância a fim de diminuir a possibilidade dos efeitos adversos do procedimento, sem, no entanto, prejudicar sua eficácia. Visto que a maioria dos pacientes com foliculite decalvante tem fototipo elevado, é indicado utilizar laser de pulso longo, como, por exemplo, o Nd:YAG. A boa resposta clínica obtida neste caso amplia as opções terapêuticas para essa patologia de difícil controle.

Referências

1 . Otberg N, Kang H, Alzolibani AA, Shapiro J. Folliculitis decalvans. Dermatol Ther. 2008;21(4):238-44

2 . Bastida J; Valerón-Almazán P; Santana-Molina N, Medina-Gil C; Carretero-Hernández G. Treatment of folliculitis decalvans with tacrolimus ointment. Int J Dermatol. 2012;51(2):216-20

3 . Mihaljevic N; von den Driesch P. Successful use of infliximab in a patient with recalcitrant folliculitis decalvans. J Dtsch Dermatol Ges. 2012;10(8):589-92

4 . Parlette EC, Kroeger N, Ross EV. Nd:YAG laser treatment of recalcitrant folliculitis decalvans. Dermatol Surg. 2004;30 (8):1152-4

5 . Boyd AS, Binhlam JQ. Use of an 800-nm pulsed-diode laser in the treatment of recalcitrant dissecting cellulitis of the scalp. Arch Dermatol. 2002;138(10):1291-3

6 . Chui CT, Berger TG, Price VH, Zachary CB. Recalcitrant scarring follicular disorders treated by laser-assisted hair removal: a preliminary report. Dermatol Surg. 1999;25(1):34-7

7 . Ross EV, Cooke LM, Timko AL, Overstreet KA, Graham BS, Barnette DJ. Treatment of pseudofolliculitis barbae in skin types IV, V, and VI with a long-pulsed neodymium: yttrium aluminum garnet laser. J Am Acad Dermatol. 2002;47(2):263-70

8 . Tan E, Martinka M, Ball N, Shapiro J. Primary cicatricial alopecias: clinicopathology of 112 cases. J Am Acad Dermatol. 2004;50(1):25-32

9 . Powell JJ, Dawber RP, Gatter K. Folliculitis decalvans including tufted folliculitis: clinical, histological and therapeutic findings. Br J Dermatol. 1999;140(2):328-33

10 . Powell J, Dawber RPR. Successful treatment regime for folliculitis decalvans despite uncertainty of all aetiological factors. Br J Dermatol. 2001; 144(2):428-429


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