2810
Views
Open Access Peer-Reviewed
Relato de casos

Preenchimento profundo do sulco lacrimal com ácido hialurônico

Flávia Naranjo Ravelli1, Juliana Sandin1, Fernanda Dias Pacheco Sakai 1, Ana Carolina Lisboa de Macedo1, Viviane Chehin Curi1, Thais Adura Pepe1

Data de recebimento: 04/12/2010
Data de aprovação: 15/11/2011

Trabalho realizado na clínica privada das
autoras – São Paulo (SP), Brasil.

Conflitos de interesse: Nenhum
Suporte financeiro: Nenhum

Abstract

A aparência resultante da protusão da gordura orbital, agravada com discromia local, é esteticamente desagradável e piora com o envelhecimento. O objetivo deste trabalho é relatar o tratamento do sulco lacrimal de 15 pacientes com preenchimento de ácido hialurônico. O produto foi introduzido profundamente através de retroinjeção. Onze pacientes (73%) demonstraram satisfação após o procedimento. Dois casos (13%) apresentaram edema na região, um (6%) passou a salientar a hipercromia das pálpebras inferiores, e outro (6%) apresentou irregularidade na superfície cutânea preenchida, sendo tratado com hialuronidase. Essa técnica demonstrou bons resultados sem complicação grave.

Keywords: ÁCIDO HIALURÔNICO, REJUVENESCIMENTO, ORBITA, PELE


INTRODUÇÃO

Devido à aparência de cansaço ou tristeza que provocam, as olheiras representam importante problema estético, determi- nando enorme impacto na qualidade de vida. 1-3 Vários fatores são implicados em sua etiologia, e o reconhecimento de cada um deles é importante para seu correto tratamento. 2-5

Sua principal causa é a hiperpigmentação local, que pode ser decorrente de hipercromia pós-inflamatória, como ocorre na der- matite atópica ou alérgica. Além disso, a predisposição genética e a exposição solar excessiva podem levar ao aumento da produção de melanina e, consequentemente, ao escurecimento local. 2,4,5

Apesar de as olheiras poderem ocorrer em pacientes jovens com hipoplasia malar, elas se tornam mais evidentes com o enve- lhecimento. Isso se deve em parte à pseudo-herniação da gordura orbital, que simula a formação de "bolsa" causadora de sombra e evidenciadora do sulco lacrimal, piorando o aspecto das olheiras. 2-6

A transparência excessiva da pele periorbital somada a sua hipervascularização também causa escurecimento do local, já que os vasos do subcutâneo se tornam mais evidentes. 2-5 Nesse aspecto a terapêutica mais indicada seria o preenchimento da região infraorbital, diminuindo a transparência da pele. 3-5

Atualmente o ácido hialurônico (AH) é o agente mais seguro e mais utilizado em preenchimentos cosméticos, sendo bem tolerado e promovendo bom resultado estético. 1,7-9 Raramente apresenta efeitos adversos graves, e a maioria de suas complicações desaparece quando o produto é degradado. 8 A região periorbital, no entanto, apresenta características anatômi- cas difíceis para a realização de preenchimento. 10 Apesar de cons- tituírem eventos raros, a oclusão da artéria retiniana e a lesão do nervo óptico são as complicações mais temidas, podendo ser evitadas através do conhecimento da anatomia local. 1,6,10

OBJETIVO

Relatar o tratamento do sulco lacrimal de 15 pacientes através de preenchimento profundo com injeções de AH.

MÉTODOS

O estudo foi realizado em clínica privada de dermatologia. Os 15 pacientes foram fotografados antes e 15 dias após o pro- cedimento. Utilizou-se anestesia tópica com lidocaína 5% asso- ciada à prilocaína 5%. A agulha de 30G fornecida com a medi- cação foi utilizada para aplicar o AH atrás do músculo orbital e anteriormente ao periósteo da borda infraorbital, na região do sulco lacrimal. O produto foi introduzido em profundidade, paralelamente à borda orbital. Na parte medial não foram reali- zadas injeções, sendo o produto massageado manualmente para ocupar aquele espaço. Visando diminuir as possíveis complica- ções, a agulha penetrou a pele em aproximadamente três pontos bilateralmente. Em cada sulco foi injetado aproximadamente 0,4ml de Juvederm® Ultra XC (Allergan, Estados Unidos) com lidocaína. Após o procedimento nenhum cuidado adicional foi instituído além da aplicação de gelo no local. Tratamentos adicio- nais, como laser, peeling ou toxina botulínica não foram realiza- dos nesse momento. Os pacientes foram avaliados 15 dias e seis meses após o procedimento, e os efeitos adversos foram relatados.

RESULTADOS

Dos 15 pacientes tratados, 14 eram do sexo feminino (93%), e a média de idade foi de 42 anos. Nenhum paciente necessitou de mais de uma sessão para preencher o sulco (Figuras 1, 2, 3 e 4).

Em relação à satisfação, 11 pacientes (73%) demonstraram-se satisfeitos após o procedimento. Quatro queixaram-se de efeitos adversos transitórios e leves. Dois casos (13%) apresentaram edema na região palpebral inferior nos dias subsequentes, mas obtiveram resolução espontânea em aproximadamente um mês. Em um caso (6%) a hipercromia das pálpebras inferiores foi salientada após o pro- cedimento e em outro (6%) houve irregularidade na superfície cutâ- nea preenchida (hipercorreção), sendo necessário tratamento local com hialuronidase 2000 UTR (0,01ml em dois pontos). Nenhum paciente se queixou de equimoses ou hematomas no seguimento.

DISCUSSÃO

Devido à peculiar anatomia da região orbital não há con- senso na literatura sobre a melhor forma de aplicação do AH. 10 Coimbra descreveu a técnica do rosário com aplicação de AH de baixa concentração e viscosidade (18mg/ml) em planos superficiais, mostrando que 15 dias após, sete dos 30 pacientes necessitaram de tratamento complementar. 10 A maioria dos tra- balhos, no entanto, mostra a utilização de AH em concentrações maiores, variando de 20 a 24mg/ml. 10

Uma vez que o objetivo do preenchimento da área das olheiras é repor o volume local, também optamos por utilizar o AH em concentração mais alta (24mg/ml), com ótimos resulta- dos em apenas uma sessão.

Apesar de Coimbra ter necessitado de mais de uma sessão, a quantidade total do produto foi semelhante à que descreve- mos, em média 0,4ml de AH para cada lado. Nossos dados diver- gem da maioria dos trabalhos, que em geral utilizam quantida- des maiores do produto e em mais de uma sessão. 2-4,11

Alguns casos de coloração azulada na região preenchida (efeito Tyndall) são relatados, principalmente em pacientes com fototipos baixos, quando o produto é aplicado superficialmen- te. 1,11 Em nenhum dos nossos pacientes essa complicação foi per- cebida, provavelmente pelo fato de o preenchedor ter sido apli- cado em planos mais profundos, técnica semelhante à descrita por outros autores. 1,3,6,11

Goldberg e cols. utilizaram AH (Restylane R®) através da téc- nica de preenchimento inframuscular com múltiplas passadas de agulha em diversas direções, tratando concomitantemente outras áreas da face. 12 Já Steinsapir e cols. realizaram micropunturas pro- fundas com Restylane R®, tendo ambos relatado maior número de complicações, como edema persistente. 6,12 Utilizamos a técnica de retroinjeção apenas no sulco lacrimal, pois o número de picadas é menor, diminuindo o risco do surgimento de equimoses.

A literatura descreve que algum grau de equimose local e edema leve e transitório são esperados na maioria dos pacien- tes. 2,4,11 Apesar de os autores perceberem leve equimose no momento da aplicação, na avaliação 15 dias após o procedimen- to já não havia nenhuma alteração.

Quando a causa principal das olheiras é a hiperpigmenta- ção cutânea, a utilização do preenchedor pode piorar seu aspec- to, já que eleva o tecido da pálpebra. 12 Em nosso estudo um dos pacientes queixou-se de piora da discromia, e o motivo foi o tra- tamento inadequado para a causa de sua olheira.

Apenas um paciente necessitou de hialuronidase para cor- reção de irregularidade após o procedimento, número muito inferior ao encontrado na literatura. 6,12 >Outras complicações descritas, porém não encontradas neste estudo foram: linfedema irresponsível à hialuronidase, enxaqueca e celulite na região.6,12

Interrupção vascular causada por compressão ou obstrução do fluxo sanguíneo pode ocorrer, tanto por lesão vascular dire- ta como por embolização, podendo, aliás, levar à amaurose. 1,2,4,11 Assim como descrito, não obtivemos nenhum caso de compli- cações visuais após o procedimento. São de extrema importân- cia, no entanto, o conhecimento da anatomia local e o domínio da técnica adequada para evitar possíveis complicações.

CONCLUSÃO

Mesmo que a anatomia da região periorbital seja comple- xa, com conhecimento adequado e treinamento podemos tratar a área das olheiras com aplicação profunda de AH. Apesar dos efeitos adversos descritos, a maioria de nossos pacientes acredita que o preenchimento da região das olheiras melhorou a aparên- cia e a autoestima, diminuindo a impressão de cansaço e propor- cionando rejuvenescimento local.

Referências

1 . Infraorbital hollow treatment by dermal fillers. Dermatol Surg.2007;33(9): 1116-1119.

2 . Deep-fill hyaluronic acid for temporary treatment of the naso-jugal groove: a report of 303 consecutive treatments. Ophthal Plast Reconstr Surg.2006; 22(5):344-348.

3 . The hyaluronic acid push technique for the nasojugal groove. Dermatol Surg. 2008;34(1):127-31.

4 . Infraorbital dark circles: definition, causes, and treatment options. Dermatol Surg. 2009;35(8):1163-71.

5 . Treatment of infraorbital dark circles by autologous fat transplantation: a pilot study. Br J Dermatol.2009;160(5):1022-5.

6 . Deep-fill hyaluronic acid for the temporary treatment of the naso-jugal groove: a report of 303 consecutive treatments. Ophthal Plast Reconstr Surg.2006;22(5):344-8.

7 . Avaliação da permanência do ácido hialurônico injetável no sulco nasogeniano e rítides labiais. Surg Cosmet Dermatol.2011;3(2):112-5.

8 . Preenchimento dos sulcos orbital inferior e naso-jugal com ácido hialurônico de baixa concentração: uma nova técnica de aplicação. Surg Cosmet Dermatol.2010;2(1):67-70.

9 . Anatomy and nonsurgical correction of the tear trough deformity. Plast Reconstr Surg.2009;125(2):699-708.

10 . Filling the periorbital hollows with hyaluronic acid gel: inicial experience with 244 injections. Ophthal Plast Reconstr Surg.2006; 22(5):335-343.


Licença Creative Commons All content the journal, except where identified, is under a Creative Commons Attribution-NonCommercial 4.0 International license - ISSN-e 1984-8773