Glaysson Tassara Tavares1, Felipe Osta de Oliveira1, Rafael de Abreu Moraes1, Thaís Sanai Batista1
Keywords: BLEOMICINA, CICATRIZ HIPERTRÓFICA, QUELÓIDE
A cicatrização é processo complexo que resulta na forma- ção de novo tecido para reparo de uma solução de continuida- de. A evolução normal das fases de cicatrização em indivíduos hígidos geralmente determina cicatriz final de bom aspecto estético e funcional. 1 Qualquer interferência nesse processo pode levar à formação de cicatrizes de má qualidade, alargadas e pigmentadas. Dentre as afecções cicatriciais, destacam-se a cica- triz hipertrófica e o queloide, que ocorrem a partir da hiperpro- liferação de fibroblastos, com conseqüente acúmulo de matriz extracelular e, especialmente, pela excessiva formação de coláge- no. 1-3 O queloide consiste em lesão elevada, brilhante, prurigi- nosa ou dolorosa, de localização dérmica. Sinais que o diferen- ciam da cicatriz hipertrófica são a localização além dos limites da ferida original, com invasão da pele normal adjacente, cresci- mento ao longo do tempo, com ausência de regressão espontâ- nea, evolução com recorrência após excisão, e história pessoal ou familiar. 4 Apresenta-se, a seguir, caso de paciente com lesões gigantes, rebeldes à terapêutica convencional, tais como injeções intralesionais de corticosteroides e radioterapia.
Paciente do sexo feminino, 24 anos, branca, apresentava, há cinco anos, queloides extensos acometendo os lóbulos das ore- lhas D e E e o ângulo da mandíbula direita (Figuras 1, 2 e 3), originados em orifícios para colocação de brincos. As lesões eram inestéticas, apresentando ulcerações e odor forte, causando grande desconforto à paciente.
A paciente já fora submetida a três tratamentos, sendo os dois primeiros constituídos por exérese das lesões, seguida de infiltração de corticosteroide, com intervalo mensal. O terceiro tratamento consistiu de exérese das lesões, seguida de cinco ses- sões de radioterapia e de utilização de malha compressiva.
Houve piora, e as lesões tiveram suas dimensões aumentadas em aproximadamente três vezes.
O tratamento proposto foi a redução cirúrgica dos queloi- des e infiltrações com bleomicina. Para a redução cirúrgica, empregaram-se técnicas diferentes nos lados D e E. Nos queloi- des do lóbulo da orelha D e do ângulo da mandíbula realizou- se a incisão dentro das margens do queloide, com exérese da massa tumoral, seguida de sutura. Na lesão da orelha E foi reali- zada exérese tangencial (shaving) subtotal do queloide, que cica- trizou por segunda intenção.
Foram realizadas dez infiltrações de bleomicina (15u diluí- das em 5ml de SF 0,9%) com média de 0,04ml por sessão, sendo seis infiltrações com intervalo mensal, duas com intervalo tri- mestral, e as duas últimas semestrais. O início do tratamento foi em janeiro de 2007, e o final em janeiro de 2009. Houve exce- lente resposta, com ótimo resultado estético (Figuras 4, 5 e 6). Contudo, no queloide em que foram realizadas exérese e sutu- ra, a cicatriz ficou levemente infiltrada, e no que foi empregado o shaving a cicatriz ficou mais discreta e com consistência amolecida, sugerindo que essa seria a técnica ideal para redução de queloide. Após acompanhamento de 30 meses as cicatrizes man- têm-se estáveis, sem sinais de recorrência.
A bleomicina é droga amplamente usada em oncologia. Trata-se de mistura de polipeptídeos citotóxicos com proprie- dades antibacteriana, antiviral e antitumoral. Foi isolada de um fungo de solo, Streptomyces verticillus, no início dos anos 60. 3 O mecanismo de ação na pele permanece incerto, porém há evi- dências de que ela aumenta o fator de necrose tumoral local. 2 Os efeitos colaterais são mínimos, sendo descritas em alguns pacien- tes hiperpigmentação e atrofia. 1,4 Devido a sua alta seletividade para células epiteliais, há relatos do uso da bleomicina intralesio- nal para o tratamento de certas doenças da pele, como verrugas, sarcoma de Kaposi, leucoplasia, hemangiomas e linfangiomas. 1,5 Os resultados mostraram-se satisfatórios e promissores para todas essas lesões, mas, devido ao pequeno número de pacientes estu- dados, não pode ser dado como método de rotina antes que sur- jam novos elementos. Com relação a seu uso para o tratamento de queloides, a literatura tem mostrado bons resultados, consti- tuindo opção interessante, entre outras. Contudo, faz-se neces- sária, também, a realização de estudos mais amplos e bem con- trolados.
1 . Saray, Y. and Güleç, A. T. Treatment of keloids and hypertrophic scars with dermojet injections of bleomycin: a preliminary study. Int J Dermatol. 2005; 44(9): 777-84.
2 . Naeini FF, Najafian, J, Ahmadpour K. Bleomycin Tattooing as a Promising Therapeutic Modality in Large Keloids and Hypertrophic Scars Dermatol Surg 2006; 32(8): 1023-30.
3 . Shridharani SM, Magarakis M, Manson PN, Singh NK, Basdag B, Rosson GD. The Emerging Role of Antineoplastic Agents in the Treatment of Keloids and Hypertrophic Scars: a Review. Ann Plast Surg. 2010; 64(3): 355-61.
4 . Heller R, Jaroszeski M, Reintgen D, Puleo C, DeConti R, Gilbert R, et al. Treatment of cutaneous and subcutaneous tumors with electroche motherapy using intralesional bleomycin. Cancer. 1998; 83(1): 148-57.
5 . Espana A, Solano T, Quintanilla E. Bleomycin in the treatment of keloids and hypertrophic scars by multiple needle punctures. Dermatol Surg. 2001; 27(1): 23-7.