Mikeli Arfelli Cabrera1, Fabiane Mulinari-Brenner1
Keywords: FACE, DURAPATITA, RAIOS X
Observa-se aumento do uso dos preenchedores cutâneos na última década, tidos como opção não cirúrgica versátil e segura para correção de contornos e aumento volumétrico com múltiplas aplicações estéticas. 1 O Radiesse® é preenchedor cutâ- neo composto por microesferas de hidroxiapatita de cálcio (HaCa) dispersas em gel carreador. Sabe-se que a HaCa tem comportamento radiopaco e por isso é usada como contraste radiológico há duas décadas. 2
Alguns relatos e séries de casos demonstram que o raio X convencional pode ocasionalmente evidenciar a HaCa que foi aplicada em tecidos moles de face com finalidade estética, em especial quando são usados grandes volumes, como ocorre no tratamento da lipodistrofia relacionada ao HIV. 3 Esse material também é detectado em tomografia computadorizada (TAC), ressonância magnética (RNM) e tomografia com emissão de pósitrons (PET/CT) com captação de 2-fluoro 2-dioxi-D-gli- cose (FDG) na área que recebeu esse preenchedor. 4
No estudo propõe-se avaliar a repercussão radiológica do uso desse preenchedor em pequeno volume na restauração do volume malar para rejuvenescimento facial.
Avaliar as características radiológicas da HaCa aplicada em pequenos volumes nos tecidos moles da face com finalidade estética, a capacidade de interferência da HaCa na avaliação de raio X convencional e o uso desse exame para avaliar a presen- ça e a posição do preenchedor.
Este estudo foi observacional qualitativo prospectivo, apro- vado pelo Comitê de Ética do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná. Doze pacientes do sexo femi- nino, com idades entre 41 e 73 anos, que receberam meio mili- litro de HaCa (Radiesse®) em região de derme profunda e sub- cutâneo de eminência malar para correção de hipotrofia relacio- nada ao envelhecimento (Figura 1). Foram submetidas à radio- grafia de face com duas intensidades de penetração nas incidên- cias frontal, perfil, mento-naso-placa (Waters) e axial de Hirtz (Figura 2). As pacientes participantes do estudo, que seguiu as regras de boa prática clínica, assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.
O exame foi realizado em intervalo que variou de uma a oito semanas após o preenchimento. Essas radiografias foram avaliadas em momentos distintos por dois radiologistas, um deles desconhecendo o antecedente de preenchimento, estando o outro ciente do estudo.
Na incidência axial de Hirtz foram evidenciadas imagens radiopacas amorfas projetadas em partes moles de cada região paramediana da face, em posição suprazigomática em local cor- respondente ao sítio de aplicação do Radiesse® (Figura 3 e 4). Esse achado estava presente em todas as 12 imagens quando ava- liadas sob luz forte. O preenchedor era visto com mais nitidez nas radiografias com menor penetração do raio X. Iguais resul- tados foram obtidos na avaliação do radiologista que desconhe- cia a presença do preenchedor, que forneceu laudo descritivo do achado, sem sugerir etiologia. O Radiesse® não foi detectado nas radiografias com incidências de perfil, frontal da face ou Waters.
Segundo a literatura, a tomografia computadorizada (TAC) tem mais sensibilidade para detectar a HaCa (Radiesse®), e o raio X só mostra resultados positivos quando são usados volumes grandes. 3 Os dados apresentados, porém, sugerem que, quando usada a incidência correta, a HaCa (Radiesse®) pode ser detec- tado pelo raio X mesmo em volumes pequenos. Para escolher a melhor incidência, deve-se conhecer a anatomia da região inves- tigada, as opções de incidência disponíveis para avaliá-la e o modo como essas imagens são obtidas. Para isso pode-se contar com o parecer de um radiologista. A HaCa apresenta-se ao raio X com densidade superior à dos tecidos moles, porém inferior à do osso cortical e medular 5 (Figuras 3 e 4), por isso não costu- ma estar visível quando sua imagem fica sobreposta a um osso, como aconteceu nas imagens em perfil, frontal da face e Waters (ou mento-naso-placa).
A incidência de Hirtz é obtida com a paciente em decúbi- to dorsal, com a cabeça em extensão máxima e os raios incidin- do perpendicularmente sobre sua face na direção inferossúpera (Figura 2). Nesse caso, o tecido mole da região malar pode ser avaliado sem sobreposição óssea. Na prática, essa incidência é usada para diagnóstico de fraturas do arco zigomático. A inexis- tência de sobreposição entre osso zigomático e preenchedor torna improvável que este último dificulte o diagnóstico de uma fratura. Carruters et al. também relatam que a presença da HaCa não compromete a avaliação de estruturas adjacentes e que, além disso, a disposição bilateral e simétrica auxilia em sua distinção com achados patológicos que habitualmente não exibem essas características. 3
Não foi possível avaliar posição e simetria do preenchi- mento neste estudo. Essas informações poderiam ser obtidas caso o preenchedor fosse identificado em incidências ortogo- nais, permitindo avaliar sua relação com as estruturas adjacentes em duas dimensões e inferir sobre sua altura e profundidade. Para essa finalidade, a TAC estaria mais bem indicada.
Uma possível aplicação da radiopacidade da HaCa seria no reconhecimento do preenchedor usado, dado nem sempre obti- do de modo fidedigno pela anamnese e necessário quando se planejam novos procedimentos na região ou para tratar compli- cações. Muitas vezes nesta última situação torna necessária ava- liação histopatológica. O raio X, entretanto, exame de baixo custo, acessível e não invasivo, pode auxiliar nessa investigação, já que a radiopacidade é característica que distingue preenchedo- res contendo HaCa dos demais.
Quando detectado em tecidos moles demanda diagnósti- co diferencial com algumas entidades, como calcificações dis- tróficas ou heterotópicas, ostomas miliares de pele, miosite ossi- ficante e corpos estranhos. 4,6 A paciente que recebeu preenchi- mento com HaCa deve ser alertada para comunicar a seu médi- co e seu dentista caso realize um exame radiológico do sítio tratado, para evitar, na eventualidade de detecção, suspeitas diag- nósticas que podem induzir solicitação de desnecessários exa- mes adicionais.
O preenchedor cutâneo composto por microesferas HaCa (Radiesse®) aplicado na região malar pode ser reconhecido no exame de raio X convencional com uso da incidência axial de Hirtz. Esta incidência, porém, mostrou-se ineficaz para determi- nação de posição e simetria do preenchedor. Sua presença não prejudica o diagnóstico de fraturas ósseas de face, que é a finali- dade dessa incidência, já que a imagem do preenchedor não se sobrepõe à do osso zigomático.
1 . Buck DW, Alam M, Kim JY. Injectable fillers for facial rejuvenation: a review. J Plast Reconstr Aesthet Surg. 2009;62(1):11-8.
2 . Berlin A, Cohen JL, Goldberg DJ. Calcium hydroxylapatite for facial reju venation. Semin Cutan Med Surg. 2006;25(3):132-7.
3 . Carruthers A, Liebeskind M, Carruthers J, Forster BB. Radiographic and computed tomographic studies of calcium hydroxylapatite for treat ment of HIV-associated facial lipoatrophy and correction of nasolabial folds. Dermatol Surg. 2008;34 (Suppl 1):S78-84.
4 . Valiyaparambil J, Rengasamy K, Mallya SM. An unusual soft tissue radiopacity--radiographic appearance of a dermal filler. Br Dent J. 2009;207(5):211-2.
5 . Vazquez J, Rosenthal DI. Bilateral, symmetrical soft tissue calcifications in the face. Skeletal Radiol. 2010;39(4):387-9.
6 . Feeney JN, Fox JJ, Akhurst T.Radiological impact of the use of calcium hydroxylapatite dermal fillers. Clin Radiol. 2009;64(9):897-902.