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Artigo Original

Queloides em orelhas: seguimento de 41 pacientes submetidos à cirurgia e infiltração com corticosteróides

Leticia Arsie Contin1, Ivander Bastazini Jr1, Cinthia Janine Meira Alves1, Priscila Wolf Nassif1, Dejair Caetano do Nascimento1

Recebido em: 13/06/2011
Aprovado em: 21/06/2011

Trabalho realizado no Instituto Lauro de
Souza Lima – São Paulo (SP), Brasil.

Conflitos de Interesses: Nenhum
Suporte Financeiro: Nenhum

Abstract

Introdução: A cirurgia associada a infiltrações pós-operatórias de corticosteroides é con- siderada boa opção terapêutica no tratamento de queloides de orelha, mas o índice de recidivas ainda não é bem estabelecido. Não há consenso sobre o número mínimo de infiltrações de corticosteroides necessárias para que haja diminuição das recorrências.
Objetivos: Avaliar índice de recidiva entre pacientes submetidos à cirurgia e infiltrações de corticosteroides para tratamento de queloides em lóbulo de orelha, relacionando com o número de infiltrações realizadas no pós-operatório.
Métodos: Estudo retrospectivo de 41 pacientes submetidos à excisão cirúrgica de queloides de orelha e a sessões de infiltração com acetonido de triancinolona. Foram anal- isados dois grupos:A: Submetidos a até duas sessões de infiltração. B: submetidos a três ou mais infiltrações.
Resultados: O índice de recidiva total foi de 37%, sendo 13% nos pacientes no grupo A, e 24% nos do B.Resultados não mostraram mais efetividade quando o número de infil- trações é igual ou superior a 3. P=0,74.
Conclusões: Não houve significância estatística quando comparado o número de IC no pós-operatório de queloides de orelha. São necessários estudos mais amplos que corro- borem tais resultados.


Keywords: QUELÓIDE, CORTICOSTERÓIDES, PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS AMBULATÓRIOS


INTRODUÇÃO

Queloides resultam de resposta anormal à cicatrização em indivíduos predispostos. Fatores relacionados a seu aparecimen- to são: predisposição genética, com maior incidência em hispâ- nicos, asiáticos e negros (nestes, de 5:1 a 15:1 em relação a cau- casianos), 1,2 idade (indivíduos jovens), fatores endócrinos (gravi- dez e menopausa), áreas do corpo com maior número de mela- nócitos e trauma.3 Em pacientes com lesão no lóbulo auricular, aparecem principalmente após a colocação de brincos. O diag- nóstico é clínico, e várias são as técnicas propostas para o trata- mento, associadas ou não a intervenção cirúrgica. Incluem inje- ções intralesionais de corticosteroides (IC), 5-fluoruracil, inter- feron alfa, gama, bleomicina ou verapamil, uso de tópicos como clobetasol, silicone em gel ou placa, imunomoduladores, retinoi- des e extrato de cebola, crioterapia, radioterapia, uso de brincos de pressão, ligadura de queloides sésseis e laser de colorante pul- sado entre outras. 1,4,5-7

OBJETIVO

Avaliar o índice de recidiva entre pacientes submetidos a cirurgia e IC para retirada de queloides em lóbulo de orelha, relacionando com o número de infiltrações realizadas no pós- operatório.

MATERIAIS E MÉTODOS

Realizado estudo retrospectivo analisando prontuários de 41 pacientes totalizando 46 queloides operados (cinco pacientes apresentavam lesões bilaterais).A faixa etária variou de nove a 66 anos, sendo 21 homens e 20 mulheres.

O estudo foi aprovado pelo comitê de ética do ILSL.

Foram incluídos pacientes virgens de tratamento e também submetidos a criocirurgia ou injeções de bleomicina que, ainda assim, apresentaram recorrência de lesões ou falha terapêutica.

Procedeu-se excisão intramarginal e sutura simples dos queloides pelo mesmo médico assistente, bem como IC mensais de triancinolona (20-40mg) a partir do 15o pós-operatório até o total de seis sessões.A dose inicial foi de 20mg, aumentada para 40mg caso houvesse progressão do queloide no intervalo entre as sessões. Devido ao grande número de pacientes que abando- naram ou perderam o tratamento durante o período de infiltra- ções, foram estabelecidos dois grupos de seguimento: A – pacientes operados e submetidos a até duas sessões de IC. B – pacientes submetidos a três ou mais sessões de IC.

Após o mínimo de um ano do término do tratamento, os pacientes foram contatados por telefone e questionados quanto à recorrência da lesão operada. Considerou-se recidiva se o paciente relatasse reaparecimento de lesão, independentemente de seu tamanho.

Utilizou-se o teste do qui-quadrado, corrigido pelo teste exato de Fisher, para comparar os dois grupos.

RESULTADOS

O total corresponde ao número de queloides operados. ¿2 = 0,1048; p = 0,7462; IC 95% (0,3682 - 1.684); Fisher: I.C95% (0,3682 ? 1.684); p = 0,5546.

No grupo A houve recidiva em seis pacientes, correspon- dendo a 13% do número total de lesões.No B observou-se reci- diva em 11 pacientes, 24% do número total de lesões.

Comparando-se os grupos A e B, ver tabela 1, não houve diferença estatisticamente significativa entre o número de sessões de infiltração e a ocorrência de recidiva quando empregado o teste do Qui-quadrado, corrigido pelo teste exato de Fisher. ¿2 = 0,1048; p = 0,7462; IC 95% (0,3682 - 1.684); Fisher: I.C95% (0,3682 – 1.684); p = 0,5546.

DISCUSSÃO

Queloides são lesões com grande potencial de recidiva, que varia de 0-100% de acordo com a metodologia empregada.1,3,7

A cirurgia, utilizando-se excisão intramarginal, é opção terapêutica, embora associada com taxas de recidiva de 45 a 100%. 7 Como terapia adjuvante, a associação da infiltração com corticosteroides no pós-operatório é das opções mais consagra- das, devido à propriedade dessa droga em relação à atividade ini- bidora de colagênese através do aumento de alfa-2 macroglobu- linas e alfa-1 antitripsina, levando à diminuição da síntese de colágeno. 8,9

Apesar de já demonstrada a efetividade da associação de cirurgia e infiltrações pós-operatórias, não existe consenso sobre doses ou duração do tratamento, e vários esquemas são citados.

Chowdri, Mattoo e Darzi propõem duas a cinco injeções de triancinolona semanalmente, seguidas de injeções mensais durante quatro a seis meses. 5 English et al., em revisão sobre queloides e cicatrizes hipertróficas sugere esquema de triancino- lona 20mg/ml a cada duas ou três semanas, repetidas enquanto necessário, podendo ser associado breve jato de crioterapia pre- cedendo o procedimento. 8

Protocolo menos agressivo foi proposto por Rosen, Patel, Freeman e Weiss com uma infiltração intraoperatória e duas pós- operatórias, com acetonido de triancinolona 40mg/ml. Quando não houve recidiva, o seguimento foi apenas observacional. Esse estudo envolveu 92 queloides em orelhas de 64 pacientes, com taxa de recidiva que variou de 14% para queloides tratados pela primeira vez a 40% para queloides recidivantes. 11

Aköz, Gideroglu e Akan utilizaram, em 11 pacientes, brin- cos de pressão no pós-operatório associados a gel de silicone, e a partir do 14o dia do pós-operatório, uma sessão de IC com triancinolona 20-40mg/ml nas bordas da incisão. O seguimento do estudo foi de 28 meses em média,mostrando uma taxa de cura de 89%. 1

A triancinolona também é a droga de eleição de Wolfram, Tzankov, Pulzl e Piza-Katzer em doses menores (cinco a 10mg/ml) a intervalos de três a seis semanas, descontinuando-se as infiltrações após estabilização da cicatriz, quando nova inter- venção cirúrgica era indispensável ou quando surgiam efeitos colaterais. 3

No presente estudo, obteve-se 37% de recidiva total quan- do realizadas cirurgia e infiltração, o que está dentro da média da literatura para a combinação dos procedimentos, sugerindo sua eficácia quando comparada a dados de literatura sobre a cirurgia isolada. Entretanto, em comparação às recidivas nos grupos com menor ou maior número de sessões de infiltração, não foi encon- trada significância estatística. Foi obtido, aliás, maior percentual de recidivas no grupo com maior número de infiltrações (13% no grupo tratado com até duas infiltrações e 24% no grupo que recebeu três ou mais infiltrações). Esse fato pode ser devido a terem sido incluídos no estudo, indistintamente, queloides já recidivados após tratamento prévio, situação em que as taxas de recidiva tendem a ser maiores. 11 Há ainda a possibilidade de maior adesão a tratamentos mais longos por parte daqueles cuja evolução pós-operatória seja menos favorável, com rápido cres- cimento de nova lesão, ou também recidivas prévias.

Portanto, não se pode estabelecer um número mínimo de infiltrações pós-operatórias. Outros fatores, além do número de sessões e das doses de corticoide utilizadas, podem ter influência decisiva na recorrência de um queloide, explicando, por exem- plo, por que alguns pacientes com lesões bilaterais tratados da mesma maneira apresentam recidiva só de um lado.

CONCLUSÃO

Os corticosteroides apresentam efeitos colaterais tais como risco de infecção secundária, atrofia, telangectasias, hipopigmen- tação e síndrome de Cushing. 8 Justifica-se, portanto, a tentativa de estabelecer esquemas de infiltração efetivos e com menor duração possível.

Sugere-se que a terapia adjuvante seja eficiente, mas não houve significância estatística quando comparados os dois gru- pos, ou seja, não se pode afirmar que esquemas de infiltração longos sejam necessários ou mesmo mais eficientes na preven- ção de recidivas.

São, portanto, necessários estudos mais amplos que corro- borem tais resultados e também apontem novos fatores de risco para a recorrência de queloides.

Referências

1 . Aköz T, Gideroglu K, Akan M. Combination of Different Techniques for the Treatment of Earlobe Keloids. Aesth Plast Surg. 2002; 26(3): 184-88.

2 . Alhady SMA,Sivanantharajah K.Keloids in various races:A review of 175 cases. Plast. Reconstr. Surg. 1969; 44(6): 564-66.

3 . Wolfram D, Tzankov A, Pulzl P, Piza-Katzer H. Hypertrophic scars and keloids- A review of their Pathophysiology, Risk factors, and Therapeutic Management.Dermatol Surg. 2009; 35(2): 171-81.

4 . Kelly AP. Medical and Surgical therapies for Keloids. Dermatol Ther. 2004; 17(2): 212-8.

5 . Chowdri NA, Mattoo MMA, Darzi MA. Keloids and hypertrophic scars: Results with intra-operative and serial postoperative corticosteroid injection therapy. Aust NZJ Surg. 1999; 69(9): 655-9.

6 . Bezerra S.Manejo dos quelóides. In: Gadelha AR, Costa IMC. Cirurgia Dermatológica em Consultório. São Paulo: Editora Atheneu. 2003.

7 . Stashower ME. Successful Treatment of Earlobe Keloids with Imiquimod after Tangential Shave Excision.Dermatol Surg.2006; 32(3): 380-6.

8 . English RS, Shenefelt PD. Keloids and Hypertrophic scars.Dermatol Surg. 1999; 25(8):8.

9 . McCoy BJ, Diegelmann RF, Cohen IK. In vitro inhibition of cell growth, collagen synthesis and polyhydroxylase activity by triamcinoline ace tonide. Proc Soc Exp Biol Med. 1980; 163(2): 216-22.

10 . Tang YW. Intra and post-operative steroid injections for keloids and hypertrophic scars. Br J Plast Surg. 1992; 45(5): 371-3.

11 . Rosen DJ, Patel MK, Freeman K, Weiss PR. A primary protocol for the management of ear keloids: Results of excision combined with intraoperative and postoperative steroid injections. Plast Reconstr Surg. 2007;20(5): 1395-400.


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