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Relato de caso

Cirurgia de queloide em lóbulo de orelha por excisão total com fistulectomia: relato de dois casos

Rogerio Nabor Kondo; Barbara Messias Pereira; Bianca Miyazawa; João Marcos Franco de Souza; Marina Gubert

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2025170367

Fonte de financiamento: Nenhuma.
Conflito de interesses: Nenhum.
Data de submissão: 28/04/2024
Decisão final: 08/08/2024
Como citar este artigo: Kondo RN, Pereira BM, Miyazawa B, Souza JMF, Gubert M. Cirurgia de queloide em lóbulo de orelha por excisão total com fistulectomia: relato de dois casos. Surg Cosmet Dermatol. 2025;17:e20250367.


Abstract

Existem várias técnicas cirúrgicas para o tratamento de queloides em lóbulos de orelhas. Dependendo do tamanho, da profundidade, do tempo de evolução e da forma do queloide, a cirurgia pode ser desafiadora para o cirurgião dermatológico, pois, nessas situações, as recidivas e as deformidades locais podem ocorrer mais frequentemente. Relatamos dois casos em que realizamos excisão total com fistulectomia, apresentando resultados estéticos favoráveis.


Keywords: Queloide; Orelha; Relatos de Casos; Procedimentos Cirúrgicos Ambulatórios.


INTRODUÇÃO

Queloides são crescimentos benignos, densos e desorganizados de fibras de colágeno (tipo I e III) que ocorrem em resposta a traumas na pele.1 O queloide no lóbulo de orelha (QLO) é frequente, podendo atingir até 2,5% das pessoas que usam brincos nessa região.2 A remoção do QLO pode ser desafiadora para o cirurgião dermatológico devido às altas taxas de recidivas e às chances de cicatrizes inestéticas, com risco potencial de desfiguração local.3 Existem diversas opções de tratamento, que incluem: excisão parcial ou total, corticoides intralesionais, excisão combinada com injeção de corticoide, crioterapia, cobertura de silicone, curativos pressurizados, agentes imunossupressores ou antitumorais, tratamento com laser e radioterapia.2,3 A terapia combinada apresenta melhores resultados do que a monoterapia, reduzindo as chances de recidivas.2 Relatamos dois casos de pacientes nos quais foram realizadas sessões de infiltrações de triancinolona com posterior excisão total com fistulectomia, apresentando resultado estético satisfatório. O objetivo deste relato de caso é exemplificar uma técnica possível para correção do QLO com bom nível de satisfação dos pacientes.

 

MÉTODO

Foram tratados dois pacientes com QLO, que receberam infiltrações mensais de triancinolona (10 mg), totalizando quatro aplicações antes da cirurgia:

Paciente 1: sexo masculino, 23 anos, branco, com pápula de 9 milímetros (mm) interligando-se a uma placa de 35 mm nas regiões anterior e posterior do lóbulo da orelha esquerda, respectivamente (Figura 1).

Descrição da técnica (paciente 1):

Paciente em decúbito lateral direito;

Antissepsia com polivinil-iodina 10% tópico;

Colocação de campos cirúrgicos;

Anestesia infiltrativa com lidocaína 2% com vasoconstritor;

Incisão com lâmina 15 na parte anterior do QLO e excisão transfixando o lóbulo da orelha (fistulectomia) até a região posterior. Retirada em bloco do queloide (Figura 2);

Hemostasia;

Sutura com mononáilon 5.0 em pontos simples nas faces anterior e posterior do lóbulo da orelha esquerda (Figura 3);

Infiltração com triancinolona (10 mg) (Figura 2).

Paciente 2: sexo masculino, 47 anos, pardo, com placa de 33 mm interligando-se a uma placa de 54 mm nas regiões anterior e posterior do lóbulo da orelha direita, respectivamente (Figura 4).

Descrição da técnica (paciente 2):

Paciente em decúbito lateral esquerdo;

Antissepsia com polivinil-iodina 10% tópico;

Colocação de campos cirúrgicos;

Anestesia infiltrativa com lidocaína 2% com vasoconstritor;

Incisão com lâmina 15 na parte anterior do QLO e excisão transfixando o lóbulo da orelha (fistulectomia) até a região posterior. Retirada em bloco do queloide (Figura 5);

Hemostasia;

Sutura com mononáilon 5.0 em pontos simples nas faces anterior e posterior do lóbulo da orelha esquerda (Figuras 6A e 6B);

Infiltração com triancinolona (10 mg);

Segunda etapa em 3 semanas: correção do formato do lóbulo da orelha, com excisão e retirada de faixa da pele em semifuso. Sutura com mononáilon 5.0, pontos simples.

 

RESULTADOS

Os pacientes evoluíram sem intercorrências nos primeiros dias de pós-operatório. Houve uma boa cicatrização, com resultado estético satisfatório no pós-operatório tardio (Figuras 7 e 8).

 

DISCUSSÃO

Os lóbulos de orelhas são locais comuns de formação de queloides. O manejo do QLO pode representar um grande desafio para os cirurgiões dermatológicos, principalmente quando o seu tamanho ultrapassa 2 cm, tendo em vista os riscos de deformidades anatômicas.3 A monoterapia apresenta maiores taxas de recidivas, podendo variar de 40 a 100 % dos casos. O tratamento combinado com corticoide, brincos de pressão, radioterapia e excisão cirúrgica parece reduzir esses índices de recidivas.2 Algumas técnicas cirúrgicas optam por manter as bordas dos queloides (excisão intralesional), com o objetivo de evitar danos à pele vizinha não queloidal e à camada profunda da derme, realizando apenas a remoção do grupo fibroblástico mais proliferativo (o centro do queloide). No entanto, não existe suporte suficiente na literatura de que essa proposta seja mais eficiente do que a excisão extralesional (excisão total).1 Zhu et al., em 2015, utilizaram a técnica de excisão total com fistulectomia. A cirurgia consistia em remoção total da lesão e uma incisão que atravessava toda a espessura (perfuração anteroposterior do lóbulo) na qual se encontrava a comunicação "anormal" entre a porção anterior e posterior do queloide (a "fístula" e o núcleo do queloide). Nesse estudo, 11 QLO foram tratados, e não houve recidivas após 12 meses.3

Nos dois casos descritos neste relato, utilizamos a excisão total com fistulectomia. Recomendamos que, em QLO com mais de 50 mm (como no caso 2), evite-se a retirada excessiva de pele no primeiro momento, a fim de evitar deformidades anatômicas, e reserve-se a remodelação para 3 semanas depois. Foram realizadas quatro infiltrações de triancinolona antes da cirurgia, com intervalos de 1 mês, e uma no intraoperatório. O intuito foi de suprimir os processos inflamatórios e efeitos secundários, como a redução da síntese de colágeno e glicosaminoglicanos, bem como a inibição de fatores de crescimento que poderiam contribuir para a recidiva do queloide.2

A radioterapia é um tratamento adjuvante para cirurgias do QLO,4,5 controlando a proliferação de fibroblastos, interrompendo o ciclo celular e induzindo senescência celular prematura. Pode ser usada junto com infiltração intraoperatória de corticoide, porém não está disponível gratuitamente. Devido ao seu custo, não foi realizada nos casos apresentados. Os dois pacientes do presente estudo não apresentaram recidivas após 1 ano (paciente 1) e 2 anos (paciente 2). Embora o paciente 2 tenha ficado com o lóbulo da orelha em formato menor, o próprio paciente considerou um bom resultado, com melhora na qualidade de vida, visto que se sentia constrangido pela presença do QLO. Apesar do conhecimento da excisão extralesional com fistulectomia para QLO, ainda há poucos casos relatados na literatura. Os presentes autores consideram esse tipo de procedimento uma boa opção cirúrgica, como nos casos relatados.

 

CONCLUSÃO

A excisão total com fistulectomia associada à infiltração de corticoide adjuvante se mostra uma boa opção para a resolução do QLO, apresentando um resultado estético satisfatório.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Rogerio Nabor Kondo
ORCID:
0000-0003-1848-3314
Aprovação da versão final do manuscrito, Concepção e planejamento do estudo, Elaboração e redação do manuscrito, Participação efetiva na orientação da pesquisa, Participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados, Revisão crítica do manuscrito.
Barbara Messias Pereira
ORCID:
0000-0002-1180-7438
Aprovação da versão final do manuscrito, Elaboração e redação do manuscrito, Revisão crítica da literatura, Revisão crítica do manuscrito.
Bianca Miyazawa 0009-0003-0561-8504
Aprovação da versão final do manuscrito, Elaboração e redação do manuscrito, Revisão crítica da literatura, Revisão crítica do manuscrito.
João Marcos Franco de Souza
ORCID:
0000-0002-9297-7841
Aprovação da versão final do manuscrito, Elaboração e redação do manuscrito, Revisão crítica da literatura, Revisão crítica do manuscrito.
Marina Gubert
ORCID:
0000-0002-9293-5019
Aprovação da versão final do manuscrito, Elaboração e redação do manuscrito, Revisão crítica da literatura, Revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS:

1. Olewinski L, Khodaee M. Posterior Earlobe Mass. Am Fam Physician. 2018;98(10):603-4.

2. Mascarenhas MRM, Paiva JMG, Mutti LA, Vivan MM, Yarak S. Efeito da terapia combinada no tratamento do queloide auricular. Surg Cosmet Dermatol 2015;7(3):253-6.

3. Zhu Z, Shan Y, Ying L, Zheng J, Mohamed S, Ma Z. Complete earlobe keloid resection with fistulectomy. Dermatol Surg. 2015;41(1):83-6.

4. Ekstein SF, Wyles SP, Moran SL, Meves A. Keloids: a review of therapeutic management. Int J Dermatol. 2021;60(6):661-71.

5. Cheraghi N, Cognetta A Jr, Goldberg D. Radiation therapy for the adjunctive treatment of surgically excised keloids: a review. Clin Aesthet Dermatol. 2017;10(8):12-5.


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