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Relato de casos

Uso de técnicas cirúrgicas combinadas no tratamento de cicatrizes acrômicas de lúpus discoide

Rafael Rezende Rocha de Oliveira; Jade Noleto Viana; Kaique Arriel; Rafael Rubinho; Fernanda Rytenband

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2025170359

Fonte de financiamento: Nenhuma.
Conflito de interesses: Nenhum.
Data de Submissão: 15/03/2024
Decisão final: 05/04/2024
Como citar este artigo: Oliveira RRR, Viana JN, Arriel K, Rubinho R, Rytenband F. Uso de técnicas cirúrgicas combinadas no tratamento de cicatrizes acrômicas de lúpus discoide. Surg Cosmet Dermatol. 2025;17e20250359.


Abstract

O lúpus eritematoso discoide provoca lesões crônicas que podem regredir com áreas discrômicas. Relatamos um caso clínico em que houve sucesso no tratamento de cicatrizes acrômicas por meio da combinação de técnicas cirúrgicas, como excisão, microenxertos e enxerto de pele total.


Keywords: Lúpus Eritematoso Discoide; Cicatriz; Procedimentos Cirúrgicos Operatórios.


INTRODUÇÃO

O lúpus eritematoso cutâneo crônico (LECC) é uma doença autoimune do tecido conjuntivo, que afeta mais frequentemente mulheres na quarta década de vida. A variante clínica mais comum do LECC é o lúpus eritematoso discoide (LED), caracterizado por placas eritematosas cobertas por descamação aderente. As lesões cutâneas do LED são crônicas e persistentes, podendo regredir e deixar áreas cicatriciais discrômicas, telangiectasias e alopecia cicatricial. Essas lesões, por serem inestéticas, podem ser estigmatizantes e afetar negativamente a qualidade de vida.1 Este trabalho tem como objetivo relatar um caso de sucesso no tratamento de cicatrizes acrômicas de LED, utilizando técnicas cirúrgicas combinadas, como excisão, microenxertos e enxerto de pele total, em um paciente com múltiplas comorbidades.

 

RELATO DO CASO

Trata-se de um paciente do sexo masculino, de 58 anos, portador de hipertensão e doença renal crônica dialítica, diagnosticado com quadro de LED há 13 anos, com a doença estável há 9 anos, em uso de hidroxicloroquina. Apresentava importante desconforto estético devido a cicatrizes de LED na face e no couro cabeludo. Ao exame dermatológico, observou-se placas acrômicas e atróficas nas regiões mandibular e pré-auricular esquerdas (Figura 1), assim como nas regiões occipital, temporal e parietal do couro cabeludo.

Devido às comorbidades e ao alto risco cirúrgico, optou-se, a princípio, pela realização de microenxertos de pele sadia na placa acrômica da mandíbula esquerda. A área doadora escolhida foi a região retroauricular esquerda. Realizou-se anestesia local e excisão com um punch de 3 mm, retirando cinco fragmentos, que foram colocados sobre gaze estéril e umedecidos com soro fisiológico. A área doadora não foi suturada, sendo realizado apenas um curativo compressivo. A área receptora foi incisada em cinco pontos lineares, distando entre si em 1 cm, utilizando-se um punch de 2 mm. Os microenxertos foram colocados sobre a área receptora e fixados com micropore estéril, que foi removido após 7 dias (Figura 2). O paciente retornou para consulta após 1 mês, apresentando pequenos halos de repigmentação ao redor dos microenxertos, e, 3 meses após o procedimento, apresentava halos pigmentados de cerca de 1 cm ao redor de todos os enxertos implantados, com repigmentação de cerca de 10% da cicatriz de LED (Figura 3), sem complicações e satisfeito com o tratamento. Posteriormente, novas microenxertias foram realizadas, e, após 1 ano do início do tratamento, o paciente apresentou repigmentação total da placa, com a confluência dos halos formando uma mácula de repigmentação homogênea. Nesse período, foi realizada a excisão da lesão pré-auricular com incisão em fuso de cerca de 3 cm de altura por 1 cm de largura, com fechamento primário. Após 9 meses de procedimento, houve melhora de cerca de 90% da lesão inicial. Diante desse sucesso, optou-se por realizar um enxerto de pele total na lesão cicatricial têmporo-occipital esquerda. A área doadora escolhida foi a face medial da coxa direita. Na área receptora, foi realizada a excisão de toda a lesão cicatricial hipocrômica através de fuso com lâmina fria, desprezando o fragmento cutâneo. O fragmento sadio foi, então, enxertado na área receptora, suturado e recoberto com curativo estéril. Após 8 semanas, o paciente já apresentava completa integração à área doadora, promovendo a repigmentação da região (Figura 4).

 

DISCUSSÃO

A microenxertia e o enxerto de pele total são procedimentos cirúrgicos com resultados positivos para pacientes com vitiligo estável, sem resposta aos tratamentos convencionais. A microenxertia com transplante de melanócitos visa promover a reserva de melanócitos e a repigmentação de lesões refratárias. No entanto, uma metanálise que avaliou o resultado específico da intervenção e a repigmentação demonstrou que a maior taxa de resposta foi observada em pacientes submetidos a enxerto de pele. Ambas as técnicas são simples de executar e de baixo custo, mas a literatura apresenta poucos estudos relatando a aplicação dessas técnicas em cicatrizes de LED2. Áreas de pele lesionada podem ser excisadas como forma de tratamento cirúrgico para determinadas doenças dermatológicas. Alguns casos de alopecia cicatricial podem ser corrigidos com excisão de pequenas lesões e fechamento primário. Para defeitos maiores, expansores ou extensores podem ser utilizados para permitir o fechamento sem tensão. O uso dessas técnicas também é relatado na literatura para queimaduras e lúpus cutâneo.2,3 Neste caso, foi aplicada a técnica de microenxertia por punch para transplante de melanócitos na região da mandíbula esquerda, enxerto de pele total na região temporal esquerda e excisão com fechamento primário na região pré-auricular esquerda no tratamento de um paciente adulto com lesão acrômica cicatricial na face devido ao LED. Por se tratar de lesão na face, o paciente apresentava considerável desconforto estético, o que impactava sua qualidade de vida.4 Os possíveis efeitos adversos incluem enxerto estático (sem espalhamento do pigmento), efeito cobblestone (aparência de pedra de calçamento), hiperpigmentação pós-inflamatória, falência do enxerto e formação de cicatriz. No paciente em questão, não foram observados efeitos colaterais.5 Conclui-se que as lesões discrômicas e inestéticas do LED geram importante impacto na qualidade de vida e que as técnicas de microenxertia e enxertia de pele total podem ser opções promissoras no tratamento de cicatrizes de LED estável. Novos estudos são necessários para avaliar os resultados em um número maior de pacientes, tendo em vista que há poucos relatos na literatura.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Rafael Rezende Rocha de Oliveira
ORCID:
0000-0002-4261-185x
Elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Jade Noleto Viana
ORCID:
0009-0009-3089-9743
elaboração e redação do manuscrito.
Kaique Arriel
ORCID:
0000-0002-3984-2964
Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura.
Rafael Rubinho
ORCID:
0000-0002-4913-2560
Elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura.
Fernanda Rytenband
ORCID:
0000-0002-2882-1658
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS:

1. McDaniel B, Sukumaran S, Koritala T, Tanner LS. Discoid lupus erythematosus. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2024 .

2. Ju HJ, Bae JM, Lee RW, Kim SH, Parsad D, Pourang A, et al. Surgical interventions for patients with vitiligo: a systematic review and meta-analysis. JAMA Dermatol. 2021;157(3):307-316.

3. Unger W, Unger R, Wesley C. The surgical treatment of cicatricial alopecia. Dermatol Ther. 2008;21(4):295-311.

4. Lewandowicz E, Zielinski T, Iljin A, Fijalkowska M, Trojan-Kasielska A, Antoszewski B. Surgical treatment of skin lesions in lupus erythematosus. Postepy Dermatol Alergol.2014;31(6):405-409.

5. Romagnolli LE, Reis LM, Douat FB, Delfes MFZ, Battaglin ER, Torre DS. Tratamento de lesões cicatriciais acrômicas de lúpus discoide com técnica de enxertia por punch: relato de caso. Surg Cosmet Dermatol.2014;6(2):191-193.

6. Dellatorre G, Cafrune FE. Tratamento cirúrgico do vitiligo. Surg Cosmet Dermatol.2016;8(4):289-293.


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