Cíntia Ávila Souza1; Isabella Prado Motta1; Rodrigo Leite Azevedo1; Eliane Maria Ingrid Amstalden2; Thais Helena Buffo1
Fonte de financiamento: Nenhuma.
Conflito de interesses: Nenhum.
Data de Submissão: 20/09/2023
Decisão final: 22/10/2023
Como citar este artigo: Souza CA, Motta IP, Azevedo RL, Amstalden EMI, Buffo TH. Fibromixossarcoma mimetizando lesão benigna cística: relato de caso de tumor mesenquimal de alto grau em localização atípica. Surg Cosmet Dermatol. 2023;15:e20230305.
O fibromixossarcoma é um subtipo raro de sarcoma de partes moles, caracterizado pela presença de células fusiformes e matriz mixoide. Relatamos o caso de uma paciente idosa que apresentou crescimento progressivo de um nódulo interescapular, cuja investigação confirmou o diagnóstico de fibromixossarcoma de alto grau. É notório que esta neoplasia ocorre mais comumente nos membros inferiores e pode exibir recorrência associada ao aumento do grau histológico. Por isso, diagnóstico e tratamento precoces são fundamentais na mitigação da morbimortalidade. Enfatizamos a relevância do diagnóstico de um caso atípico e da intervenção terapêutica oportuna, contribuindo para a otimização dos desfechos clínicos.
Keywords: Sarcoma; Neoplasias de Tecido Conjuntivo e de Tecidos Moles; Tumores Fibrosos Solitários
O fibromixossarcoma é um subtipo raro de sarcoma de partes moles, composto por células fusiformes e estroma mixoide. É a neoplasia mesenquimal mais comum em pacientes idosos, apresentando-se como nódulos indolores, de crescimento lento, comum nas extremidades inferiores.1 Histologicamente, de acordo com a celularidade e atipia, podem ser classificados como de baixo, intermediário ou alto grau. Esta classificação não se correlaciona com o alto risco de recidiva (entre 50-60% para todos os subtipos), mas é um fator preditor de metástases, presentes de 20-35% nos graus intermediário e alto e incomum nos de baixo grau.2 Diferentemente dos demais sarcomas, o mixofibrossarcoma apresenta a tendência de, a cada recorrência, apresentar-se gradualmente com grau histológico mais elevado.3 Diante disso, percebe-se a importância do diagnóstico, estadiamento e tratamento precoces, visando a uma menor morbimortalidade. Relatamos o caso de uma paciente idosa com mixofibrossarcoma de alto grau na região interescapular.
Paciente do sexo feminino, 68 anos, apresentou-se com lesão nodular indolor na região interescapular há um ano. Ao exame físico dermatológico inicial, observava-se lesão nodular, indolor, móvel, medindo 6 x 4cm. Apresentava USG de partes moles prévia, do início do quadro, compatível com cisto epidérmico com planos musculares livres (Figuras 1A-1B). Como a clínica não correspondia ao exame de imagem, foi solicitada tomografia, que demonstrou tratar-se de lesão cística, de 7 x 3cm de profundidade, sendo, então, agendada exérese. Após incisão, foi possível observar tecido amorfo, gelatinoso, enegrecido, não correspondendo à hipótese inicial aventada (Figuras 1C-1D). Realizada, então, biópsia profunda da lesão, com resultado histopatológico demonstrando mixofibrossarcoma de alto grau (Figura 2). Foi solicitada ressonância magnética de coluna, com presença de lesão expansiva, medindo 10,1 x 8,8 x 4,0cm, invadindo ventre muscular do trapézio subjacente, sem sinais de invasão dos demais planos musculares e das estruturas ósseas adjacentes (Figura 3). Para estadiamento, foi realizado PET-CT, que demonstrou hipermetabolismo em linfonodos axilares bilateral, sugestivos de metástases, o que não foi confirmado após biópsia dos linfonodos hipercaptantes (Figura 4). Paciente foi encaminhada à equipe da Ortopedia e foi realizada a exérese da lesão com margens amplas. Posteriormente, a paciente foi encaminhada à Oncologia para seguimento clínico, não sendo indicados tratamentos adjuvantes. Paciente mantém seguimento multidisciplinar, sem recidivas, após seis meses da exérese (Figura 5).
O fibromixossarcoma corresponde a um subtipo raro de sarcoma de partes moles, descrito pela primeira vez por Enzinger e Weiss em 1977.1 Previamente denominado histiocitoma fibroso maligno variante mixoide, apresenta origem mesenquimal, sendo composto por células fusiformes e estroma mixoide. É a neoplasia mesenquimal maligna mais comum em pacientes idosos, com predileção pela quinta a sétima décadas de vida, sendo o sexo masculino discretamente mais afetado.1-3
A localização preferencial é nos membros inferiores, sendo rara a ocorrência de lesões em tronco, membros superiores ou segmento cefálico. Em geral, apresentam-se como nódulos ou tumores indolores, de crescimento lento, normocrômicos ou discretamente eritematosos. Observa-se que sua ocorrência é maior em tecidos moles subcutâneos em relação aos tecidos profundos.1,4,5
O exame histopatológico é o padrão-ouro para estabelecer o diagnóstico. A amostra deve ser profunda para garantir uma avaliação fidedigna do material. Biópsias superficiais podem apresentar características benignas ou até mesmo subclassificar um tumor de alto grau.6 Histologicamente, é classificado como de baixo, intermediário ou alto grau, de acordo com a celularidade e atipia. A imuno-histoquímica apresenta baixa especificidade no mixofibrossarcoma sendo, em geral, positiva para vimentina e, em raros casos, para actina de músculo liso, S100 e desmina.6,7
A exérese da lesão com margens amplas é o tratamento de escolha. A recorrência local ocorre em 50-60% dos casos, e este risco parece não estar relacionado à profundidade das lesões ou ao grau histológico.8 Contudo, tem sido observado que, a cada recorrência, há uma tendência de o mixofibrossarcoma apresentar-se gradualmente mais celular, mais pleomórfico, mais mitoticamente ativo e, assim, com grau histológico mais elevado. Esta característica não é observada nos outros sarcomas. Em relação às metástases, elas são raras em tumores de baixo grau histológico, mas ocorrem entre 20-35% nos casos de tumores de intermediário e alto graus, notadamente para pulmões e ossos. O diagnóstico diferencial inclui outros tumores mixoides.1,2,8
A capacidade do tumor de apresentar altas taxas de recorrência e avançar em grau histológico sustenta a necessidade de um diagnóstico e tratamento precoces, objetivando uma menor morbimortalidade.
Cíntia Ávila Souza
ORCID: 0000-0001-8116-010X
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Isabella Prado Motta 0009-0001-2858-578X
Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.
Rodrigo Leite Azevedo
ORCID: 0000-0001-8541-0591
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.
Eliane Maria Ingrid Amstalden
ORCID: 0000-0001-7958-2426
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.
Thais Helena Buffo
ORCID: 0000-0002-6833-7596
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica do manuscrito.
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