Úrsula Metelmann1, Carlos D’Aparecida Machado Filho1, Sheila Itamara Ferreira do Couto Meireles1, Letícia Pires Vaz Brandão Teixeira1
A acne vulgar tem alta prevalência, acometendo aproximadamente 80% das pessoas em algum momento de sua vida. 1-3
Cerca de 1% dos pacientes evoluem com cicatrizes permanentes, que frequentemente são consequência da acne inflamatória nódulo-cística grave,mas também podem resultar de lesões inflamatórias mais superficiais ou de automanipulação.Além do dano estético, as cicatrizes podem causar dano psicológico. 2,3
Segundo a classificação de Kadunc e Trindade, as cicatrizes de acne podem ser de três tipos: hipertróficas (subtipos: queloideanas, hipertróficas, papulosas e pontes), distróficas e deprimidas (subtipos: distensíveis e não distensíveis). Estas últimas, podem ainda subdividir-se em superficiais,médias ou crateriformes e profundas (ice-picks e túneis). 4
Entre as ferramentas terapêuticas para o tratamento de cicatrizes de acne estão os peelings químicos, laser e outras fontes de luz, crioterapia, técnicas de preenchimento e métodos cirúrgicos, como a subincisão e a dermabrasão. 1,3
O tratamento com tecnologias ganha cada vez mais espaço na correção das cicatrizes.Dos lasers, o resurfacing ablativo com CO2, ao promover remoção controlada e parcial da epiderme e derme, sempre foi considerado, pela maioria dos autores, o padrão ouro para a correção de cicatrizes dos tipos ice-pick ou crateriforme.Devido às complicações inerentes ao método e ao tempo de recuperação de pelo menos 15 dias, ao longo dos anos sua utilização foi descontinuada. Com a introdução da tecnologia fracionada, o laser de CO2 voltou a ter o papel principal no tratamento das cicatrizes de acne. 1, 5-9
Resurfacing com laser fracionado ablativo é técnica que cria pequenas zonas de lesão cutânea em padrão de grade. As áreas atingidas reepitelizam mais rapidamente, e o risco de discromias e cicatrizes inestéticas é menor. 1, 5
A energia utilizada no equipamento é inversamente proporcional ao número de sessões, ou seja, utilizando altas energias conseguem-se bons resultados com menor número de sessões, porém com maior índice de complicações.Ainda assim, a restrição à exposição solar por tempo prolongado, o absenteísmo e as intercorrências diminuem a adesão e dificultam o tratamento com o laser fracionado de CO2. 1,5
Na tentativa de diminuir essas limitações, propomos a utilização do laser fracionado de CO2 de forma localizada, apenas sobre as cicatrizes de acne, com parâmetros intensos.O objetivo é o mesmo da técnica de Cross (Chemical Reconstruction Of Skin Scars), segundo a qual, na impossibilidade de se aplicar ácido tricloroacético em altas concentrações em toda a face, tratam-se apenas as cicatrizes, otimizando-se assim os resultados e minimizando-se as complicações. 10
Em analogia à técnica de Cross, 10 denominou-se a técnica aqui descrita Croll: cirurgia de reconstrução com laser localizado.
Foram selecionados 15 pacientes portadores de cicatrizes de acne deprimidas (ice-picks, crateriformes, túneis) para submissão à técnica de Croll: o laser de CO2 fracionado localizado apenas sobre as cicatrizes. Os pacientes não apresentavam comorbidades que contraindicassem o procedimento.
Utilizou-se para preparo da pele, combinação de hidroquinona 4%, tretinoína 0,05% e acetonido de fluocinolona 0,01% (Vitacid Plus‚ ® Theraskin, SP, Brasil) por 30 dias antes da sessão. Aplicou-se anestésico tópico de lidocaína 4% (Dermomax creme 4%‚ ® Aché, SP, Brasil) 30 minutos antes do procedimento.
Após limpeza da pele, aplicou-se o laser fracionado de CO2 de forma localizada apenas sobre as cicatrizes. O spot escolhido deve ter o formato que mais se aproxima ao da lesão, com distância entre os pontos de 200µm e profundidade do laser de 2000µs.
Após o procedimento os pacientes foram orientados a utilizar fotoprotetor colorido diariamente. Em caso de necessidade (ardência, crosta melicérica, eritema prolongado) recomendou-se a aplicação de combinação de ácido fusídico e valerato de betametasona (Verutex B‚ ® Roche, SP, Brasil )
A técnica localizada consiste em minimizar o spot do equipamento e utilizar formato preferencial de hexágono, círculo, linear ou o mais semelhante à lesão, aproximando a distância entre os pontos e aumentando a profundidade dos disparos (Figura 1). O objetivo é fazer uma varredura da epiderme de forma profunda.
Os pacientes tratados com a técnica proposta apresentaram resultados satisfatórios já no 30o dia após uma sessão de laser de CO2 localizado (Figuras 2-7). O número de sessões variou de um a três.Os pacientes com fototipo mais alto apresentaram eritema e hiperpigmentação pós-inflamatória, evoluindo com remissão completa em no máximo 60 dias. Não ocorreu hipopigmentação em nenhum caso, no seguimento de até 24 meses. Observou-se que todas as cicatrizes melhoraram,muitas desapareceram, e que as mais profundas se superficializaram.
Há mais de duas décadas o laser de CO2 é aplicado no rejuvenescimento facial, rítides, cicatrizes de acne, blefaroplastias retirada cirúrgica de lesões.No que se refere ao resurfacing ablativo, a técnica caiu em desuso na década de 1990 devido a complicações como cicatrizes hipertróficas, discromias persistentes, risco de infecção e tempo de recuperação prolongado. 1
Com a necessidade de tratamentos menos invasivos,menores complicações e recuperação mais rápida, o surgimento dos lasers fracionados de CO2 proporcionou a retomada dessa tecnologia dentro dos tratamentos cirúrgicos dermatológicos. Os aparelhos atuais permitem usar desde parâmetros bem leves, obtendo-se tratamentos superficiais até energias altas com resultados e evolu- ção muito semelhante aos obtidos com o laser de CO2 convencional. Os resultados e complicações também aumentam em escala proporcional à intensidade da terapia aplicada. 1,5,9
Existe farta documentação atestando que o fracionamento dos lasers ablativos diminuiu muito os efeitos adversos, mas, ainda assim, para a obtenção dos resultados significativos, necessita-se de terapia agressiva. 1,5, 7-9
Pacientes com cicatrizes de acne necessitam em média seis sessões do laser fracionado de CO2 habitualmente aplicado em toda a face, ou pelo menos em toda a região acometida, uma a cada 30 ou 60 dias.Nos casos mais difíceis, para se obter resposta que substitua o tratamento cirúrgico (microenxertos, excisão e sutura, exérese tangencial de pontes) o tratamento deve ser intenso, aproximando a distância entre os pontos para pelo menos 200µm e aumentando a profundidade do laser para 2000µs, (parâmetros reprodutíveis na maioria dos equipamentos), levando a um aumento da incidência de efeitos colaterais, como hiperpigmentação pós-inflamatória, eritema prolongado, dor e absenteísmo. Por esses motivos propoõe-se técnica de aplicação localizada, menos invasiva.
As vantagens da técnica de Croll em relação ao laser fracionado de CO2 aplicado em toda a face são: suficiência da anestesia tópica, recuperação e resultados mais rápidos com uma, duas ou três sessões, menos efeitos colaterais, menor desconforto e maior aderência ao tratamento.
Destacam-se ainda as vantagens do laser de CO2 em relação à própria técnica de Cross: o efeito térmico do laser promove maior retração da pele em relação à agressão química isolada, que implica a necessidade de seis a oito sessões de ácido tricloroacético para a obtenção de bons resultados. A absorção do ácido dificilmente é homogênea, sendo dependente do objeto aplicador (capilar, agulha, palito) e podendo resultar em aumento do diâmetro e profundidade da cicatriz em caso de sua difusão na pele.
Considera-se ainda positivo o fato de essa técnica poder ser aplicada em todos os tipos de cicatrizes de acne: ice picks, crateriformes, distróficas, hipertróficas, papulosas, pontes e túneis. Nestas últimas, o laser pode ser utilizado no modo pulsado, e, pelo poder de corte, a lesão é incisada e em seguida vaporizada, deixando-se cicatrizar por segunda intenção.
1 . Alam M, Dover JS. Treatment of acne scarring. Skin Therapy Lett. 2007;11(10):7-9.
2 . Jordan R, Cummins C, Burls A. Laser resurfacing of the skin for the improvement of facial acne scarring: a systematic review of the evidence. Br J Dermatol. 2000;142(3):413-23.
3 . Basta-Juzbasiç A. Current therapeutic approach to acne scars. Acta Dermatovenerol Croat. 2010;18(3):171-5.
4 . Kadunc BV,Almeida ART. Surgical Treatment of Facial Acne Scars Based on Morphologic Classification: A Brazilian Experience. Dermatologic Surgery.2003; 29(12): 1200-9
5 . Manuskiatti W, Triwongwaranat D, Varothai S, Eimpunth S, Wanitphakdeedecha R. Efficacy and safety of a carbon-dioxide ablative fractional resurfacing device for treatment of atrophic acne scars in Asians. J Am Acad Dermatol. 2010;63(2):274-83.
6 . Avram MM, Tope WD, Yu T, Szachowicz E, Nelson JS. Hypertrophic scarring of the neck following ablative fractional carbon dioxide laser resurfacing. Lasers Surg Med. 2009;41(3):185-8.
7 . Chapas AM, Brightman L, Sukal S, Hale E, Daniel D, Bernstein LJ, Geronemus RG. Successful treatment of acneiform scarring with CO2 ablative fractional resurfacing. Lasers Surg Med. 2008;40(6):381-6.
8 . Wang YS,Tay YK, Kwok C. Fractional ablative carbon dioxide laser in the treatment of atrophic acne scarring in Asian patients: a pilot study. J Cosmet Laser Ther. 2010;12(2):61-4.
9 . Cho SB, Lee SJ, Kang JM, Kim YK, Chung WS, Oh SH. The efficacy and safety of 10,600-nm carbon dioxide fractional laser for acne scars in Asian patients.Dermatol Surg. 2009;35(12):1955-61.
10 . Fabbrocini G, Cacciapuoti S, Fardella N, Pastore F,Monfrecola G. CROSS technique: chemical reconstruction of skin scars method. Dermatol Ther. 2008;21 (Suppl 3):S29-32.