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Relato de caso

Schwannoma no lábio superior em adolescente: relato de caso raro

Laura Boldrin Cardoso de Souza1; Aline da Luz Sousa1; Luís Henrique Barbizan de Moura1; Milvia Maria Simões e Silva Enokihara2; Samira Yarak1

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2024160313

Data de Submissão: 22/10/2023
Decisão final: 16/01/2024.
Fonte de financiamento: Nenhuma.
Conflito de interesses: Nenhum.
Como citar este artigo: Souza LBC, Sousa AL, Moura LHB, Enokihara MMSS, Yarak S. Schwannoma no lábio superior em adolescente: relato de caso raro. Surg Cosmet Dermatol. 2024;16:e20240313.


Abstract

Schwannomas são tumores benignos derivados das células de Schwann da bainha dos nervos. Os locais mais frequentemente envolvidos são a cabeça e o pescoço (25-48%), com apenas 1% dos schwannomas ocorrendo na cavidade oral. A maioria dos schwannomas acomete indivíduos adultos entre a terceira e a quinta década de vida. Acometimento dos lábios é extremamente raro durante a infância e adolescência, com poucos relatos na literatura. O prognóstico é favorável e a excisão cirúrgica é o tratamento de escolha. Apresentamos um caso interessante de schwannoma no lábio superior em paciente adolescente com tratamento cirúrgico bem-sucedido e sem sinais de recidiva após quatro anos.


Keywords: Neurilemoma; Lábio; Neoplasias; Células de Schwann.


INTRODUÇÃO

Schwannoma ou neurilemoma é uma neoplasia benigna que se origina das células de Schwann da bainha dos nervos periféricos ou cranianos. O nervo mais comumente envolvido é o vestibulococlear, mas pode acometer qualquer fibra mielinizada, com exceção dos nervos olfatório e óptico.1

A etiologia desses tumores não está totalmente esclarecida. Evidências sugerem que a transformação tumoral das células de Schwann é causada por mutações de perda de função do gene supressor de tumor NF2 e sugerem também que esses tumores têm predileção por locais propensos à injúria neural por compressão ou trauma físico.2 Aproximadamente 25-48% dos schwannomas ocorrem na região de cabeça e pescoço. O schwannoma é responsável por pouco mais de 1% dos tumores benignos relatados na cavidade oral, sendo a língua o local mais comum.3 Esses tumores raramente surgem nos lábios, com poucos casos relatados na literatura.3

Em geral, os schwannomas são lesões solitárias e, ocasionalmente, apresentam-se como lesões múltiplas. Clinicamente, apresenta-se como um nódulo encapsulado e de crescimento lento.4 Quando pequenos, a maioria dos schwannomas é assintomática, mas a dor, localizada no tumor ou irradiando-se ao longo do nervo de origem, pode ser uma queixa.5 Os diagnósticos diferenciais de schwannoma na região oral incluem neurofibroma, tumor de células granulares, fibroma, leiomioma, hemangioma, linfangioma, lipoma, granuloma piogênico e tumores benignos de glândulas salivares.1 Biópsia excisional e estudo anatomopatológico são indicados para estabelecer o diagnóstico.4 Histologicamente, além do schwannoma clássico, existem as variantes celular, epitelioide, glandular e plexiforme.5

A excisão cirúrgica conservadora é a melhor conduta preconizada, com remoção completa do tumor, proporcionando bom prognóstico e baixas taxas de recidiva.6 As transformações malignas são raras, não sendo recomendada a obtenção de margens de segurança.4 Neste trabalho, relatamos um caso de schwannoma clássico em localização e faixa etária incomuns.

 

RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, 16 anos, referia nódulo indolor e de crescimento lento há dois anos no lábio superior. Ao exame dermatológico, apresentava nódulo de mesma coloração da mucosa adjacente, consistência fibroelástica e dimensões de 1,5 x 1,0cm (Figura 1), sem linfadenopatia cervical. Em sua história médica pregressa, o paciente relatava trauma local esporádico.

Apesar de provável benignidade da lesão e ausência de dor local, havia ansiedade do paciente e responsáveis quanto à obtenção de diagnóstico confirmatório. Optou-se, assim, pela exérese. Sob a administração de bloqueio anestésico do nervo infraorbitário, a excisão total da lesão foi realizada. Procedeu-se à técnica de incisão longitudinal e enucleação do tumor, preservando-se a estrutura nervosa, a função motora e a sensibilidade local (Figura 2).

O exame histopatológico revelou um schwannoma encapsulado composto pelo padrão de Antoni A com os corpos de Verocay e Antoni B (Figura 3). Mitose e necrose não foram detectadas. A imuno-histoquímica mostrou reação positiva ao anticorpo SOX10 no núcleo das fibras neurais (Figura 4).

Durante o período de seguimento de quatro anos, não foi observada recorrência da lesão. Além disso, foi obtido bom resultado cosmético, sem prejuízo na funcionalidade ou sensibilidade local.

 

DISCUSSÃO

Schwannomas são tumores benignos, de crescimento lento, encapsulados e geralmente solitários. Embora a etiologia dos neurilemomas permaneça desconhecida, postula-se que as lesões originem-se da proliferação de células de Schwann, podendo comprimir e deslocar o nervo circunjacente.7

A maioria dos casos relatados de schwannomas ocorre em cabeça e pescoço. Apesar de a região oral ser intensamente inervada, apenas 1% desses tumores são originados de nervos periféricos da cavidade oral.4 O lábio superior é uma das localizações menos prováveis, com apenas alguns casos documentados.1 Os neurilemomas podem ocorrer em qualquer idade, mas com predileção por indivíduos entre a terceira e a quinta décadas de vida, o que contrasta com o paciente relatado neste caso. O diagnóstico do schwannoma é baseado em características histológicas.8 Neste caso, a apresentação histológica foi característica e facilmente distinguível de outras lesões compostas por células fusiformes, como neurofibroma e leiomioma. As características do tumor neste relato preenchem todos os critérios histológicos para ser classificado como schwannoma clássico. Tipicamente, é observado o tecido do tipo Antoni A, composto por células fusiformes alinhadas, cujos núcleos formam uma paliçada típica. Entre duas paliçadas vizinhas, existem pequenas massas eosinofílicas chamadas corpos de Verocay, formadas pela combinação dos citoplasmas das células de Schwann e pelas fibras reticulares associadas. O tecido tipo Antoni B compreende um número menor de células fusiformes que estão dispostas aleatoriamente dentro de um estroma mixomatoso frouxo.5 A distribuição da paliçada nuclear (típica de um schwannoma) foi facilmente identificável.8

De modo complementar, a análise imuno-histoquímica mostrou reação positiva difusa ao anticorpo SOX10 no núcleo das fibras neurais. Atualmente, os marcadores imuno-histoquímicos mais utilizados para o diagnóstico dos schwannomas são o S100 e o SOX10.9

O prognóstico do schwannoma é favorável, e a excisão cirúrgica conservadora é facilitada pela cápsula, que fornece um plano de dissecção seguro. Em geral, não há recidiva com excisão completa.6 No entanto, se ocorrer recidiva, é necessário considerar se a enucleação completa foi alcançada ou se ocorreu uma transformação maligna. A transformação maligna é rara e consideravelmente mais comum para schwannomas labiais do que para os que ocorrem em outros locais (9,47% versus 0,001%).4

Apesar de sua raridade, schwannomas devem ser considerados no diagnóstico diferencial de nódulos labiais, devido à abundante inervação do lábio.1 O diagnóstico precoce de lesões, ainda em pequenas dimensões, aumenta a chance de um desfecho cirúrgico bem-sucedido, uma vez que a ressecção pode ser particularmente complexa devido à extensa rede neuronal que inerva os lábios.4 Este paciente teve excelente evolução pós-operatória, sem sinais de recidiva e sem danos sensitivos após quatro anos de seguimento.

 

CONCLUSÃO

Embora o schwannoma de lábio superior seja extremamente raro, ele também deve ser considerado pelos dermatologistas na avaliação de lesões nos lábios. Conhecer os aspectos histológicos e imuno-histoquímicos deste tumor é essencial para evitarem-se erros diagnósticos e obter-se uma abordagem cirúrgica satisfatória. A técnica de enucleação de tumor encapsulado nesta região é apropriada, pois permite uma cicatriz esteticamente favorável e preserva a integridade do nervo periférico.

 

AUTHOR’S CONTRIBUTION:

Laura Boldrin Cardoso de Souza
ORCID:
0000-0003-4709-3227
Approval of the final version of the manuscript; study design and planning; preparation and writing of the manuscript; collecting, analyzing, and interpreting data; critical review of the literature; critical review of the manuscript.
Aline da Luz Sousa
ORCID:
0000-0003-1720-2525
Approval of the final version of the manuscript; study design and planning; collecting, analyzing, and interpreting data; intellectual participation in propaedeutic and/or therapeutic conduct of studied cases; critical review of the literature; critical review of the manuscript.
Luís Henrique Barbizan de Moura
ORCID:
0000-0002-5714-8386
Approval of the final version of the manuscript; intellectual participation in propaedeutic and/or therapeutic conduct of studied cases; critical review of the manuscript.
Milvia Maria Simões e Silva Enokihara
ORCID:
0000-0002-3340-4074
Approval of the final version of the manuscript; intellectual participation in propaedeutic and/or therapeutic conduct of studied cases; critical review of the manuscript.
Samira Yarak
ORCID:
0000-0002-5657-6645
Approval of the final version of the manuscript; study design and planning; effective participation in research guidance; intellectual participation in propaedeutic and/or therapeutic conduct of studied cases; critical review of the manuscript.

 

REFERÊNCIAS:

1. Phulware RH, Sardana R, Chauhan DS, Ahuja A, Bhardwaj M. Extracranial Schwannomas of the head and neck: a literature review and audit of diagnosed cases over a period of eight years. Head Neck Pathol. 2022;16(3):707-715.

2. Helbing DL, Schulz A, Morrison H. Pathomechanisms in Schwannoma development and progression. Oncogene. 2020;39(32):5421-5429.

3. Bhola N, Jadhav A, Borle R, Khemka G, Bhutekar U, Kumar S. Schwannoma of the tongue in a pediatric patient: a case report and 20-year review. Case Rep Dent. 2014;780762.

4. Sitenga J, Aird G, Vaudreuil A, Huerter CJ. Clinical features and management of Schwannoma affecting the upper and lower lips. Int J Dermatol.201857(9):1047-1052.

5. Lever WF, Elder DE. Lever’s histopathology of the skin. 10th ed. Philadelphia: Wolters Kluwer Health/Lippincott Williams & Wilkins, Cop; 2009.

6. Yaghoobi R, Pazyar N. Lower lip plexiform schwannoma: report of a rare case and a literature review. Indian J Dermatol.2019;64:407-410.

7. Shim S, Myong H: Neurilemmoma in the floor of the mouth: a case report. J Korean Assoc Oral Maxillofac Surg. 2016;42:60-64.

8. Yang SW, Lin CY. Schwannoma of the upper lip: case report and literature review. Am J Otolaryngol. 2003;24:351-354.

9. Sergheraert J, Zachar D, Furon V, Khonsari RH, Ortonne N, Mauprivez C. Oral plexiform schwannoma: a case report and relevant immunohistochemical investigation. SAGE Open Med Case Rep. 2019; 19;7:2050313X19838184.


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