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Artigo de revisão

A importância da toxina botulínica no tratamento da notalgia parestésica: uma revisão

Bianca de Brito Tavares; Camila Abreu Figueiredo; Julia Rodrigues Pontes; Juliana Messias Moraes Guapo; Marcele Lima Cunha; Sandra Lopes Mattos Dinato

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2023150230

Data de submissão: 22/02/2023
Decisão Final: 28/02/2023
Fonte de financiamento: Nenhuma.
Conflito de interesses: Nenhum.
Como citar este artigo: Tavares BB, Figueiredo CA, Pontes JR, Guapo JMM, Cunha ML, Dinato SLM. A importância da toxina botulínica no tratamento da notalgia parestésica: uma revisão. Surg Cosmet Dermatol. 2023;15:e20230230.


Abstract

A notalgia parestésica (NP) é uma neuropatia sensorial caracterizada por prurido, com ou sem a presença de uma mácula. O tratamento com toxina botulínica A pode ter efeitos benéficos no prurido, possivelmente por inibição da substância P. O objetivo deste estudo é avaliar os benefícios/limitações da toxina botulínica no tratamento da NP. A metodologia consistiu na seleção das publicações por meio do PubMed e na filtragem dessas publicações por critérios predefinidos. Cinco artigos foram compilados, e os resultados foram favoráveis em quatro deles. Conclui-se que há eficácia do tratamento com toxina botulínica A na maioria dos artigos, principalmente na melhora do prurido.


Keywords: Prurido; Toxinas botulínicas tipo A; Hiperestesia; Hiperpigmentação.


INTRODUÇÃO

A notalgia parestésica (NP) consiste em uma neuropatia sensorial crônica, mais frequente em mulheres de meia-idade, caracterizada por prurido em região escapular, geralmente unilateral, com ou sem a presença de mácula hiper ou hipocrômica. Outros sintomas também podem estar presentes como dor, parestesia, hipoestesia ou hiperestesia.1 A etiologia dessa condição ainda não é bem esclarecida. Contudo, diversos estudos propõem causas multifatoriais como compressão muscular dos nervos espinhais, sobretudo em região de dermátomos de T2 a T6.1 Outras causas possíveis são o acometimento de nervos torácicos por degeneração e herniação de disco intervertebral, lesões osteoarticulares que cursam com hiperostose, entre outras.2 O diagnóstico da NP é realizado principalmente por meio da história clínica e do exame físico detalhados.2

Em relação ao tratamento de notalgia parestésica, há uma variedade de opções, com diferentes níveis de sucesso, incluindo medicações orais, agentes tópicos, injeção de toxina botulínica A, estimulação nervosa elétrica transcutânea (TENS) e fisioterapia.2 O tratamento com a toxina botulínica A pode ter efeitos benéficos em relação ao prurido, possivelmente por meio da inibição da liberação de substância P pelo neurônio pré-sináptico.1,2 Porém, há resultados divergentes sobre a relação custo e eficácia do uso dessa modalidade terapêutica.1

O objetivo deste estudo consiste em avaliar os benefícios do uso da toxina botulínica A no tratamento da notalgia parestésica.

 

MÉTODOS

Realizou-se a seleção das publicações em maio de 2022 para identificar todos os estudos clínicos sobre a utilização da toxina botulínica tipo A no tratamento da NP. Por meio das bases de dados PubMed, foi realizada a busca bibliográfica, no período dos últimos 20 anos, com as palavras-chave: ‘Botulinum Toxin', ‘Notalgia Paresthetica', ‘Treatment', ‘Hyperesthesia', ‘Itching', ‘Hyperpigmented patch pruritus'.

Os dados de três pesquisadores captados independentemente foram confrontados e considerados critérios de inclusão: artigos do tipo ensaio clínico randomizado, série de casos, estudo prospectivo e relato de caso; publicados em Português, Inglês ou Espanhol. Foram excluídos os artigos de revisão. No total, foram compilados sete artigos para leitura completa e análise do texto.

 

RESULTADOS

Foram incluídos cinco artigos para análise nesta revisão de literatura. Os resultados foram favoráveis ao uso da toxina botulínica A em quatro artigos.3, 4, 5, 6

Na série de casos conduzida por Weinfield P. et al.,3 foram aplicadas no total 16U de toxina botulínica tipo A em um dos pacientes e 24U no outro. Ambos experimentaram melhora sintomática que se manteve após 18 meses, avaliada por relatos dos próprios pacientes. O que utilizou menor dosagem experimentou também redução da área hiperpigmentada.

Wallengren J. et al.4 realizaram um estudo prospectivo com seis pacientes, em que foi realizada injeção intradérmica de toxina botulínica A, com doses de 18–100U. Cinco dos seis pacientes relataram melhora do prurido uma semana após o procedimento. Em seis semanas após o tratamento, houve uma redução da intensidade do prurido de 28% na escala visual analógica (VAS). Os dois pacientes que reportaram melhora do prurido após seis semanas do tratamento foram acompanhados por 18 meses, sendo que um deles permaneceu sem prurido e o outro reportou uma redução do prurido de 45% de acordo com a VAS.

Na série de casos de Pérez-Pérez L.5, cinco pacientes refratários a terapias tópicas e sistêmicas foram incluídos, gerando resultados variáveis. A aplicação de toxina botulínica tipo A variou entre 50 a 56U. Três desses pacientes experimentaram melhora no prurido após um mês, que não se manteve pelo semestre seguinte. Os outros dois apresentaram menores sintomas após seis meses de tratamento, porém só um deles manteve o resultado até 18 meses.

De acordo com o relato de caso conduzido por Datta S. et al. ,6 o uso de toxina botulínica foi favorável em uma paciente de 58 anos que sofria com prurido refratário e acometimento funcional causado pela NP. Foram usadas 2-5U de toxina botulínica tipo A em 3ml de soro fisiológico (0,9%), via intradérmica, em uma distância de 1-2cm da área acometida.

Não houve relevância estatística nos achados em apenas um dos artigos. O ensaio clínico randomizado duplo-cego de Maari C. et al.7 incluiu 20 pacientes com NP resistente a tratamentos tópicos prévios. Os pacientes foram randomizados em dois grupos: um grupo que seria tratado com toxina botulínica A e o outro grupo-controle, que recebeu solução salina isolada (grupo placebo). Após 12 semanas do tratamento, não houve diferença significativa entre os grupos em relação à melhora do prurido e da hiperpigmentação.

 

DISCUSSÃO

A presente revisão literária demonstra que o uso de toxina botulínica em pacientes portadores de NP está sendo realizado há, pelo menos, 15 anos desde a data de publicação dessa dissertação.

O uso da toxina botulínica tipo A ainda não tem sua dose terapêutica definida dentro da NP. Desse modo, foram compiladas nessa revisão dosagens de 2 a 200U. A variação de dose é justificada pela variabilidade das áreas de superfícies afetadas. Apesar dessa justificativa, nem todos os trabalhos estabeleceram uma relação de dose por área.

A análise sobre o efeito terapêutico baseou-se, em sua maioria, na melhora do prurido, principal sintoma da doença, e da área de hiperpigmentação. As ferramentas utilizadas para quantificar essa melhora também foram discrepantes, variando desde relatos qualitativos dos pacientes até o uso da VAS por profissionais de saúde ou pelo próprio paciente.

O acompanhamento dos trabalhos incluídos para constatar a duração do efeito terapêutico variou de seis a 18 meses. Um dos relatos de caso não especificou a duração do acompanhamento nem como o efeito foi avaliado.

Os efeitos colaterais do uso da toxina botulínica só foram abordados em um dos estudos incluídos, em que se constatou a ausência dos mesmos, exceto pela sensação de ardor durante a injeção, presente em 100% dos pacientes.4

A principal limitação do estudo presente refere-se à inclusão de diferentes tipos de estudo, com consequentes diferentes níveis de evidência.

 

CONCLUSÃO

O uso de toxina botulínica A no tratamento de NP mostrou-se efetivo na maioria dos artigos incluídos nesta revisão de literatura, sobretudo em relação à melhora do prurido. Contudo, apesar dos benefícios demonstrados em quatro artigos, a duração de melhora dos sintomas apresentou-se variável nos diferentes estudos analisados, fator que limita a análise sobre a eficácia dessa terapêutica (Tabela 1).

Mais estudos são necessários para definir o efeito da toxina botulínica tipo A na NP, já que o único caso clínico randomizado incluído não demonstrou resultados favoráveis. Outra justificativa para tal afirmação é a discrepância entre as doses utilizadas e as ferramentas para avaliação dos resultados.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Bianca de Brito Tavares
ORCID:
0000-0001-6753-5075
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Camila Abreu Figueiredo
ORCID:
0000-0002-2162-4176
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Julia Rodrigues Pontes
ORCID:
0000-0002-2729-6302
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Juliana Messias Moraes Guapo
ORCID:
0000-0001-5851-8900
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Marcele Lima Cunha
ORCID:
0000-0002-7021-2151
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Sandra Lopes Mattos Dinato
ORCID:
0000-0002-4547-0474
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS:

1. Howard M, Sahhar L, Andrews F, Bergman R, Gin D. Notalgia paresthetica: a review for dermatologists. Int J Dermatol. 2018;57(4):388-92.

2. Robbins BA, Rayi A, Ferrer-Bruker SJ. Notalgia Paresthetica. In: Blake AR, Rayi A, Ferrer-Bruker. StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2022

3. Weinfeld PK. Successful treatment of notalgia paresthetica with botulinum toxin type A. Arch Dermatol. 2007;143(8):980-2.

4. Wallengren J, Bartosik J. Botulinum toxin type A for neuropathic itch. Br J Dermatol. 2010;163(2):424-6.

5. Pérez-Pérez L, García-Gavín J, Allegue F, Caeiro JL, Fabeiro JM, Zulaica A. Notalgia paresthetica: treatment using intradermal botulinum toxin A. Actas Dermosifiliogr. 2014;105(1):74-7.

6. Datta S, Mahal S, Bhagavan SM, Govindarajan R. Use of botulinum toxin Type A in a patient with Refractory Itch From Notalgia Paresthetica. J Clin Neuromuscul Dis. 2020;21(4):243-4.

7. Maari C, Marchessault P, Bissonnette R. Treatment of notalgia paresthetica with botulinum toxin A: a double-blind randomized controlled trial. J Am Acad Dermatol. 2014;70(6):1139-41.


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