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Artigo Original

Estudo de avaliação da eficácia do ácido tranexâmico tópico e injetável no tratamento do melasma

Denise Steiner1, Camila Feola1, Nediana Bialeski1, Fernanda Ayres de Morais e Silva1, André César Pessanha Antiori1, Flávia Alvim Sant’Anna Addor1, Bruno Brandão Folino1

Recebido em: 10/10/2009
Aprovado em: 11/11/2009
Declaramos a inexistência de confl itos
de interesse.

Abstract

Introdução: Melasma é uma hipermelanose adquirida de etiologia multifatorial e de tratamento difícil. O ácido tranexâmico (AT) tem sido estudado como alternativa terapêutica. Objetivo: Avaliar a eficácia e a segurança do AT no tratamento de melasma, comparando utilização de microinjeção localizada versus tratamento tópico. Material e Método: Foram selecionadas 18 mulheres com melasma, tratadas por 12 semanas com: Grupo A: aplicação domiciliar tópica de AT 3% 2x ao dia. Grupo B: injeções intradérmicas AT (4 mg/mL) semanais. Antes e após o tratamento, os grupos foram comparados sob os seguintes parâmetros: evolução fotográfica, evolução do MASI, autoavaliação e colorimetria. Resultados: 17 pacientes completaram o estudo. A avaliação fotográfica revelou, no grupo A, melhora em 12,5%, piora em 50% e, em 37,5%, não houve alteração alguma. No grupo B, 66,7% de melhora e 22,2% sem alterações. Em relação ao MASI, houve melhora significativa (p = 0,0026), sem diferença entre os tratamentos (p = 0,6512). Na autoavaliação, no grupo A,37,5% das pacientes classificaram como boa e 50%, como imperceptível. No grupo B, 66,7% classificaram como boa e 33,3%, imperceptível. A avaliação colorimétrica revelou melhora significativa nos tratamentos (p = 0,0008). Conclusão: Embora a avaliação clínica subjetiva tenha demonstrado superioridade do tratamento injetável, na avaliação objetiva, ambos os tratamentos revelaram–se significativamente eficazes, o que indica que o AT é uma nova e promissora opção terapêutica para o melasma.

Keywords: ÁCIO TRANEXÂMICO, MELASMA, TERAPÊUTICA


INTRODUÇÃO

O melasma é uma hipermelanose crônica adquirida que afeta áreas fotoexpostas da pele, principalmente as regiões frontal e malar.1 É uma condição comum, que acomete indivíduos de todas as raças e ambos os sexos. É mais observado em mulheres que se encontram em idade fértil e com fototipos mais altos (especialmente IV-V) e que vivem em áreas com elevada radiação ultravioleta (UV).2-4

Embora a etiologia e a patogênese do melasma não estejam completamente esclarecidas, existem vários fatores implicados. Em 30% dos casos, a ocorrência familiar sugere predisposição genética.1 A radiação UV é considerada importante fator, mas outros também estão relacionados, como o uso de contraceptivos orais, medicamentos fototóxicos e disfunção da tireoide. Recentemente, estabeleceram-se interações entre vascularização cutânea e melanogênese.5-7 No entanto, a maioria dos casos de homens e um terço dos casos de mulheres apresentam caráter idiopático.8

Diante da elevada prevalência, muito se tem estudado acerca das opções terapêuticas para o tratamento do melasma, especialmente pelo possível impacto psicológico negativo e dificuldade de tratamento pelo curso recorrente e refratário. Até o momento, não há terapia com resultados totalmente satisfatórios. Steiner et al. observaram, em uma revisão sistemática, que o uso de protetor solar de amplo espectro associado a cremes de despigmentação, como hidroquinona (associada ou não à tretinoína), constitui a base fundamental do tratamento, e novas opções terapêuticas têm surgido, o que demanda estudos mais profundos para avaliar sua eficácia.1

O ácido tranexâmico (AT), que é uma droga hidrofílica inibidora da plasmina, classicamente utilizada como agente antifibrinolítico, tem sido estudado como alternativa para o tratamento do melasma.9 Estudos recentes revelaram que seu uso tópico previne a pigmentação induzida por UV em cobaias10 e que seu uso intradérmico intralesional produz clareamento rápido.11

O AT bloqueia a conversão do plasminogênio (presente nas células basais epidérmicas) em plasmina, por meio da inibição do ativador de plasminogênio.11,12

A plasmina ativa a secreção de precusores da fosfolipase A2, que atuam na produção do ácido araquidônico e induzem a liberação de fator de crescimento de fibroblasto (bFGF). Trata-se de um potente fator de crescimento de melanócito.12 Já o ácido araquidônico é precursor de fatores melanogênicos, como, por exemplo, prostaglandinas e leucotrienos.

O ativador de plasminogênio é gerado pelos queratinócitos e aumenta a atividade dos melanócitos in vitro. Apresenta níveis séricos aumentados com o uso de anticoncepcionais orais e na gravidez. O bloqueio dessa substância pode ser por mecanismo parácrino, por meio do qual o AT reduz a hiperpigmentação do melasma.12

O objetivo deste trabalho foi avaliar a eficácia e a segurança do ácido tranexâmico (AT) no tratamento do melasma, comparando a utilização de microinjeção localizada versus o tratamento tópico.

MATERIAL E MÉTODO

Este estudo foi desenvolvido no ambulatório do serviço de residência médica em dermatologia da Universidade de Mogi das Cruzes e os testes colorimétricos, em um centro privado de pesquisa clínica.

Trata-se de um ensaio clínico aberto, comparativo e randomizado em que foram estudados 18 pacientes, com idade entre 23 e 52 anos (média de 40,58 anos), do sexo feminino, fototipos de II a V, segundo classificação de Fitzpatrick, com diagnóstico clínico de melasma.

Os critérios de exclusão foram coagulopatias e/ou uso de anticoagulante em pacientes com história de intolerância ao veículo ou ao princípio ativo.

A partir da inclusão no estudo, todas as pacientes foram orientadas a não aplicar outro produto para o tratamento do melasma, além de protetor solar FPS 30 a cada quatro horas durante o dia. As pacientes foram tratadas por 12 em dois grupos: Grupo A: oito pacientes, aplicação domiciliar do creme com ácido tranexâmico 3% duas vezes ao dia; Grupo B: dez pacientes, injeções intradérmicas com 0,05 mL de ácido tranexâmico (4 mg/mL) em cada cm² de melasma, após aplicação de anestesia tópica com cloridrato de lidocaína 2%, uma vez por semana.

Exames laboratoriais, incluindo hemograma e coagulograma, foram realizados em todas as participantes. Avaliações de segurança foram realizadas em cada visita de acompanhamento.

Foram avaliados os seguintes parâmetros antes e após 12 semanas de tratamento: fotografias analisadas por avaliador independente (classificada como inalterada, presença ou ausência de melhora); SCORE MASI (Melasma Área and Severity Index); satisfação das pacientes (classificando a melhora como boa, imperceptível e ruim) e colorimetria por meio do equipamento CR300 com coleta de medidas em três áreas diferentes (malar direita, malar esquerda e dorso da mão direita como controle).

O colorímetro fornece três variáveis L, a, b, coordenadas de um eixo tridimensional, onde L representa luminosidade variando de 0 (preto) a 100 (branco), a (grau de eritema) e b (variação de cor entre azul e amarelo). Calculou-se também o ITA (arctg [(L-50)/b)] x 180/3,1416), índice que mede a pigmentação da pele, em que os menores valores indicam uma pele mais escura e os maiores valores, uma pele mais clara.

Análise estatística

O modelo utilizado para a análise estatística foi o linear com medidas repetidas, considerando as medidas antes e após tratamento em três locais diferentes de cada paciente. Para o modelo em questão, usamos uma correlação autorregressiva de ordem 1.

Aspectos éticos

Este estudo foi realizado sob a aprovação prévia de um comitê de Ética em pesquisa e desenvolvido, de acordo com as normas de boas práticas clínicas. Todas as pacientes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido antes de participar das avaliações.

RESULTADOS

Dezessete pacientes completaram o estudo, oito do grupo A e nove do grupo B.

A duração média do melasma foi de 8,125 anos (Gráfico 1), com alto impacto na qualidade de vida em 50% das pacientes. Fatores associados como início da gestação, piora à exposição solar e uso de anticoncepcionais orais ocorreram em, respectivamente, 31,25%, 87,5% e 12,5% dos casos (Gráfico 2).

A avaliação fotográfica demonstrou que, em relação ao grupo A, houve melhora em 12,5%, piora em 50% e, em 37,5%, não houve alterações. No grupo B, 66,7% das pacientes apresentaram melhora, 11,1%, piora, e 22,2% permaneceram inalteradas. A Figura 1 demonstra exemplos da avaliação fotográfica.

Em relação ao MASI, houve melhora significativa, passando, em média, de 12,45 para 8,84 (p = 0,0026). Não houve diferença entre os tratamentos tópico e injetável (p = 0,6512) (Tabela I).

Na autoavaliação quanto à melhora do melasma, no grupo A 37,5% das pacientes classificaram como boa, 50%, como imperceptível, e 12,5%, como ruim. No grupo B, 66,7% classificaram como boa e 33,3% como imperceptível.

A avaliação colorimétrica demonstrou melhora significativa, em ambos os tratamentos, passando de -6,44 para -1,56, em média (p = 0,0008). Não houve diferença entre os tratamentos (p = 0,8790) (Tabela II).

Os efeitos colaterais foram mínimos, como eritema, equimose e ardência local, e as pacientes toleraram o tratamento.

DISCUSSÃO E CONCLUSÃO

O ácido tranexâmico (AT) é uma droga hidrofílica inibidora da plasmina classicamente utilizada como agente antifibrinolítico por meio da administração via oral ou intravenosa de 0,5 a 2,0 g, três ou quatro vezes por dia. Recentemente, esse fármaco vem sendo estudado como alternativa para o tratamento do melasma, por apresentar, por meio do uso tópico, prevenção da pigmentação induzida por UV em cobaias e produzir clareamento rápido pelo uso intradérmico intralesional.9-11

O AT bloqueia a conversão do plasminogênio (presente nas células basais epidérmicas) em plasmina, por meio da inibição do ativador de plasminogênio.11,12 A plasmina ativa a secreção de precusores da fosfolipase A2, que atuam na produção do ácido araquidônico (precursor de fatores melanogênicos, tais como prostaglandinas e leucotrienos), e induzem a liberação de fator de crescimento de fibroblasto (bFGF) – potente fator de crescimento de melanócito.12

O ativador de plasminogênio, que é gerado pelos queratinócitos e apresenta níveis séricos aumentados com o uso de anticoncepcionais orais e na gravidez, aumenta a atividade dos melanócitos in vitro, e o bloqueio desse efeito pode ser o mecanismo parácrino por meio do qual o AT reduz a hiperpigmentação do melasma.12

Este estudo procurou abordar uma nova modalidade de tratamento utilizando o ácido tranexâmico em solução injetável ou aplicação tópica. A dose média de AT injetada em nossos pacientes foi de 1,5 mg, que é inferior à dose habitual utilizada com efeito antifibrinolítico, e a concentração no creme de uso tópico a 3% apresenta mínima absorção sistêmica.

Ambas foram comparadas sob vários aspectos, como, por exemplo, evolução fotográfica, evolução do escore MASI, impressão pessoal das pacientes, colorimetria, tolerância à droga e aos veículos.

Dentre as avaliações subjetivas, observou-se melhora maior no grupo B em 66,7% dos casos pela avaliação fotográfica, em comparação com 12,5% dos casos no grupo A. Observou- se diferença na autoavaliação, com 66,7% das pacientes do grupo B classificando como “boa resposta ao tratamento”, versus 37,5% do grupo A. Esses resultados são compatíveis com o resultado do MASI, com melhora mais evidente no grupo injetável, já que no grupo A a média do MASI foi de 12,7 para 9,9 após 12 semanas e, no grupo B, de 12,2 para 7,8, representando variação percentual de 22,04% no grupo A e 36,07% no grupo B. Porém, estatisticamente, houve redução significativa do MASI após 12 semanas em ambos os grupos; todavia, não se observou diferença relevante entre eles.

Em um estudo realizado por Lee et al. em 2006, utilizando- se apenas medidas subjetivas para avaliar a eficácia do ácido tranexâmico injetável no tratamento do melasma, constatou-se redução do MASI em 42,74% após 12 semanas de tratamento e na avaliação dos próprios pacientes; 86% consideraram os resultados bons, resultados semelhantes aos encontrados em nosso estudo.11

Uma das desvantagens dos métodos subjetivos de avaliação são os prováveis vieses na realização de ensaios clínicos. Dessa forma, neste estudo também se utilizou avaliação objetiva pela medida colorimétrica que permite análise quantitativa da pigmentação durante o tratamento. A avaliação colorimétrica revelou melhora significativa em ambos os grupos, passando de -6,44 para -1,56, em média, onde os menores valores indicam pele mais escura e os maiores, pele mais clara. Não houve diferença entre os grupos.

Os exames laboratoriais das pacientes incluídas no estudo - hemograma completo e RNI (relação normalizada internacional) - não mostraram alteração antes e após o tratamento.

Os efeitos colaterais foram mínimos, como eritema, equimose e ardência local, e as pacientes toleraram bem o tratamento, cuja realização mostrou-se segura.

Apesar de a avaliação clínica subjetiva ter demonstrado superioridade do tratamento injetável, na avaliação objetiva ambos os tratamentos mostraram-se eficazes, sem diferença estatística entre os grupos.

Concluindo, esse tratamento mostrou-se eficaz, sem efeitos colaterais significativos. Por tal razão, o AT apresenta-se como uma nova e promissora opção terapêutica para o melasma, podendo ser utilizado tanto na forma de creme como de solução injetável.

Estudos adicionais englobando maior número de participantes serão necessários para definir dosagem ideal, frequência de aplicações, benefícios e manutenção dos resultados. Além disso, ensaios para avaliar o uso combinado de AT com tratamentos já consagrados como clareadores tópicos (hidroquinona, fórmula de Kligman) e peelings químicos são necessários a fim de identificar eventuais efeitos aditivos na busca de melhores tratamentos para o melasma.

Referências

1 . Steiner D, Feola C, Bialeski N, Silva FAM. Tratamento do Melasma: revisão sistemática. Surg & cosmetic dermat 2009; 1:87-94.

2 . Kroumpouzos G, Cohen LM. Dermatoses of pregnancy.J Am Acad Dermatol 2001; 45:1-19.

3 . Pathak MA, Fitzpatrick TB, Kraus EW. Usefulness of retinoic acid in the treatment of melasma. J Am Acad Dermatol 1986; 15:894-9.

4 . Hassun KM, Bagatin E, Ventura KF. Melasma. Rev Bras Med 2008; 65:11-6.

5 . Bolanca I, Bolanca Z, Kuna K et al. Chloasma - the mask of pregnancy. Coll Antropol 2008; 32(2):139-41.

6 . Kim EH, Kim YC, Lee ES, Kang HY. The vascular characteristics of melasma. J Dermatol Sci 2007; 46(2):111-6.

7 . Grimes PE. Melasma. Etiologic and therapeutic considerations. Arch Dermatol 1995; 1453-7.

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9 . Manosroi A, Podjanasoonthon K, Manosroi J. Development of novel topical tranexamic acid liposome formulations. Internat J Pharmaceutics 2002; 235:61-70.

10 . Maeda K, Naganuma M. Topical trans-4-aminomethylcyclohexanecarboxylic acid prevents ultraviolet radiation induced pigmentation. J Photochem Photobiol 1998; 47:130-41.

11 . Lee JH, Park JG, Lim SH et al. Localized Intradermal Microinjection of Tranexamic Acid for Treatment of Melasma in Asian Patients: A Preliminary Clinical Trial. Dermatol Surg 2006; 32:626-31.

12 . Maeda K, Tomita Y. Mechanism of the inhibitory effect of tranexamic acido n melanogenesis in cultured human melanocytes in the presence of keratinocyte-conditioned médium. J Health Sci 2007; 53(4):389-96


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